"Somos todos desconhecidos para nós mesmos, e se fazemos alguma ideia de quem somos, é apenas porque vivemos dentro dos olhos dos outros": diz o escritor norte-americano Paul Auster em Diário de Inverno, seu segundo livro de memórias.
No século XVII, o escritor e clérigo anglicano, John Donne afirmou: "A morte de qualquer homem "(leia-se, por favor, ser humano) "diminui-me porque sou parte do gênero humano, e por isso não perguntes por quem os sinos dobram, eles dobram por ti."
Leitor de Donne, o escritor norte-americano Ernest Hemingway, escreveu um romance em 1940 que tem o nome "Por quem os sinos dobram". Leitor de Hemingway, o compositor e cantor brasileiro Raul Seixas batizou o seu nono album e uma canção com o nome: "Por quem os sinos dobram".
Feito uma corrente, com ressonâncias, agora inclusive tecnológicas, artistas em épocas diferentes da história da humanidade indagam: sem o outro, quem somos nós?
Do nascimento à nossa morte, estamos sempre em companhia de outros seres humanos e se não fossem eles nem saberíamos quem somos. E do nascimento à morte estamos ou somos vestidos.
Aprendemos o nosso nome de tanto ouvir, na primeira infância, nos chamarem pelo nome que recebemos (sem saber) quando chegamos ao mundo. E dos outros, leia-se pai, mãe, irmãos, avós, tios, primos. amigos, professores, babás, cuidadoras - vêm as informações, desde o momento que nascemos (até o momento que morremos) do que é apropriado ou não vestir, quais são as combinações de cores possíveis, o que é chique, o que não é chique, o que é contestação, o que não é contestação, o que ser feminina, o que é ser masculino, etc.
Ser enxergado pelo outro é fundamental para a nossa existência e para a nossa própria sobrevivência. Sim, estamos vivendo um momento de profundo individualismo, mas mesmo assim, não vivemos sem o outro. Estão aí as novas tecnologias como, por exemplo, facebook, twitter, instagram, whatsapp etc - para comprovar que o olhar do outro é fundamental, para a nossa existência.
E o vestir - por que nos vestimos, afinal? Por que usamos roupas? Esse foi um trabalho que realizei em sala de aula. E o meu ex-aluno André Luiz da Cunha Chaves afirmou: "a partir do momento em que saímos da cama, a roupa passa a ser nossa identidade, o nosso cartão de visita para quem não nos conhece. (....) A linguagem do vestir nos serve como mensageiro direto do que estamos pensando ou do momento que estamos passando."
O interessante trabalho realizado por André Luiz incluiu uma entrevista com a jornalista Iesa Rodrigues que diz:"vestir roupa é imperativo, pela necessidade de proteger o corpo do clima e de olhares. Vestir moda já tem outra conotação: vem da vontade de ser atual e que está integrado em um determinado grupo social."
Já Milton Santos, (imortal) professor de geografia da USP afirmou: "(...) No caso brasileiro, o corpo da pessoa também se impõe como uma marca visível e é frequente, no Brasil, privilegiar a aparência como condição primeira de objetivação e de julgamento, criando uma linha demarcatória, que identifica e separa, a despeito das pretensões de individualidade e de cidadania do outro".
Fica aqui uma reflexão: será que o nosso olhar a tudo se acostuma e, consequentemente, se banaliza?
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