sábado, 10 de dezembro de 2011

O que é arte?

1. Uma tentativa de definição

“A arte é cada vez mais necessária, ainda mais no mundo massificado e massacrante em que vivemos hoje, onde pouco espaço resta ao ser para respirar. Não houvesse arte, não suportaríamos. O excesso de materialismo, intolerância, violência, a ‘infraternidade’ é o oposto da arte. Arte é exatamente o contrário: une, melhora quem faz e quem absorve, melhora os seres e aprimora o mundo.” Olga Savary – escritora, jornalista e tradutora.

Definir arte é uma tarefa árdua, pois significa cair num terreno de areia movediça. Ou seja, há milhares de estudos sobre arte e cada um traz uma definição, uma explicação, e nenhuma delas é completa. Por isso, ao invés de buscar uma definição é melhor procurar entendê-la, através de seus elementos mais característicos.

Em nossa época as artes são vistas, sobretudo, como uma área privilegiada do fazer humano que permite ao indivíduo uma liberdade de ação emocional e intelectual inexistente nos outros campos de atividade humana, por isso unicamente o trabalho artístico é qualificado de criativo. Mas essa visão é muito relativa, uma vez que uma boa arte é um dom, uma habilidade desenvolvida em duro exercício de paciência.

Enxergar a arte como “um duro exercício” é um dado importantíssimo, pois como diz a sabedoria popular, “criar é 90% de transpiração e 10% de talento.” Ou seja, nada de pensar que um artista, um criador, já nasce pronto. Sem dúvida, o dom e o talento de “mexer” com a sensibilidade humana é uma coisa que a pessoa tem e que ninguém sabe explicar. Mas esse talento necessita ser “burilado”, o artista precisa encontrar uma linguagem que expresse seu dom, sua sensibilidade, e isso exige um longo trabalho.

Pessoas sensíveis não se envergonham em expressar ou deixar transparecer a emoção que sentem, quando deparam com uma obra de arte que os toca, que os faz sentir alguma coisa. E essa obra que fala sem utilizar palavras – tanto pode ser uma escultura, uma cerâmica ou um quadro (estamos nos restringindo aqui às artes plásticas) pode ter sido criada por um artista com formação acadêmica ou por um artesão analfabeto, que nunca saiu do sertão. O que ocorre é que o verdadeiro artista imprime ao seu trabalho uma singularidade tão sua, que transforma um mero objeto em arte. A representação desse objeto, aparentemente banal, vem impregnada de sua concepção do que vem a ser esse objeto. Podemos ir, mais além, a arte que nos toca, e nos faz, momentaneamente, “escapulir” da rotina, do corre-corre diário, e que nos faz sonhar, pode ser absolutamente simples. Tão simples que pode nos levar a dizer: “puxa, por que não pensei em fazer algo assim?” Só que esta aparente simplicidade não é espontânea. Ela é fruto de um intenso trabalho. A busca da simplicidade exige, às vezes, de um artista anos de pesquisa. É o domínio de uma linguagem, que propicia essa simplicidade.

Todo artista, todo criador necessita pesquisar muito as formas. Pois criar é formar. Criar é dar uma forma a algo novo. Leia-se como novo, aqui, novas propostas, novas coerências estabelecidas pela mente humana; fenômenos vistos ou relacionados de uma maneira inédita ou diferente. Então, a capacidade de criar inclui a de relacionar, ordenar, configurar e significar. Trocando em miúdos, o ser humano sempre foi um ser formador, um ser com conteúdo, capaz de relacionar os eventos, fatos ou fenômenos ocorridos em volta dele. Só que ao artista, ao criador cabe configurar os fatos dando a sua “versão”, a sua interpretação, o seu jeito de ver/enxergar o fato. Ele dá significado aos estímulos que recebe diariamente. E esses estímulos podem estar relacionados a fatos corriqueiros como, por exemplo, o jeito como as pessoas andam, as casas, as cores, sons, cheiros.

Todas as pessoas recebem, a cada instante, dezenas de estímulos. Mas só os artistas são capazes de fazer uma releitura desses mesmos estímulos, associando-os uns aos outros, ordenando-os. E essa ordenação dos estímulos sempre segue uma organização interna, do nosso interior. Constitui-se numa busca de significados. E esta busca de ordenação é que leva o ser humano a buscar novas formas e, consequentemente, a criar. Ou seja, o artista se comunica com os demais seres humanos através das ordenações das formas oriundas , ora do seu cotidiano, ora de seu próprio inconsciente, revistas com lucidez e toques de imaginação. Isso acontece porque a arte é fruto de um processo intuitivo, como veremos, a seguir, ao refletir sobre a relação entre a arte e a intuição.

1.1 ARTE E INTUIÇÃO

A intuição vem a ser o ato de perceber, discernir, o ato ou capacidade de pressentir. Todo artista tem um lado de oráculo: ele prevê, profetiza ou advinha aspirações, sonhos e desejos humanos. Um exemplo: quando criou as bijuterias, numa época em que as mulheres ainda só usavam jóias, Gabrielle Coco Chanel previu que a mulher da segunda metade do século XX iria valorizar sobretudo a praticidade. Antecipando-se, Chanel criou a bijuteria nos anos 30/40 e declarou: “o que vale é o efeito e não os quilates”. Outro exemplo: ao lançar o New Look (um estilo luxuoso, baseado em ricos tecidos, fartas e amplas saias) o estilista Christian Dior previu que seus contemporâneos ansiavam conviver com as formas sonhadoras, sobretudo porque a realidade era de racionamento, escassez e de pobreza numa Europa destruída pela Segunda Grande Guerra. E o New Look de Dior explodiu feito uma “bomba atômica” com seu estilo requintado, que exibia formas precisas e ultra femininas, num momento em que as mulheres haviam até se esquecido da sua feminilidade e trajavam pesados e sisudos conjuntos que mais pareciam uniformes militares. Dior, com o New Look , captou o inconsciente coletivo da época, e ajudou a reerguer a indústria têxtil francesa. Chanel, ao inventar a bijuteria, antecipou um estilo baseado na praticidade que só ficou consagrado após os anos 60 do século XX. Na história da moda há diversos exemplos de estilistas que são criadores e que usam e abusam de sua intuição para lançar novas formas. Ou seja, eles captam, através da contemplação, da observação, verdades diferentes daquelas que se atinge por meio da razão e do conhecimento analítico. O artista, o criador, caminha no sentido oposto ao famoso pragmatismo voltado à ação imediata, e que é praticado, atualmente, pela maioria das pessoas.

Pragmático: voltado para a ação, para as aplicações práticas. O conhecimento é um instrumento a serviço da ação. O pragmatismo é uma doutrina criada por Charles Sanders Peirce (1839-1914), filósofo americano.

Mas quem deseja fazer arte, criar, se comunicar com seus semelhantes através da forma, não pode ser pragmático e muito menos ocupar a cabeça com preconceitos. Uma professora de história da moda no Brasil, curso ministrado numa escola de moda do Rio de Janeiro, pediu aos seus alunos uma proposta de estilo de uma moda nacional, baseada na influência da arte africana e na Umbanda e no Candomblé, religiões trazidas para o Brasil pelos escravos. Uma aluna trouxe dois desenhos razoáveis e viáveis. Até aí, tudo bem. Mas no texto explicativo, que deveria acompanhar o trabalho ela afirmou: “Destaco que estas religiões são praticadas só pelos pobres (..)”.Posteriormente, a professora perguntou à aluna “ de onde havia tirado esse preconceito, que lhe soou como um aviso de segregação social. Será que ela ignorava os inúmeros artistas, estudiosos e políticos nacionais adeptos dessas religiões? E citou alguns dos mais conhecidos: Caetano Veloso, Gilberto Gil (ex-ministro da cultura), Carlinhos Brown, fora os já falecidos Carybé, Jorge Amado, Zélia Gatai e o ex-governador e ex-senador Antonio Carlos Magalhães. E a aluna refletiu ... E aprendeu uma lição importante: um estilista que deseja criar, que deseja fazer arte – leia-se que deseja interpretar novos caminhos da forma – jamais deve ser escravo de idéias preconcebidas e nem pode se fechar num mundo elitista. Para “tocar” as pessoas, para se comunicar com os seus semelhantes, o verdadeiro artista, às vezes, utiliza a intuição, não só para “acessar” seu próprio inconsciente individual, mas também o inconsciente coletivo da espécie humana, povoado por figuras míticas, símbolos e formas, e que é motivo de estudos na psicanálise.

1.2 Eliminando os preconceitos

Muitos artistas têm a sorte de captar, feito bruxos, o que as pessoas anseiam exatamente nesse momento. Outros, porém, andam a frente do seu tempo e profetizam estilos que apenas serão consagrados no futuro (próximo ou longínguo). Posso exemplificar com duas mulheres brasileiras, dois “oráculos” não compreendidos na época em que viveram. A primeira foi Pagu, pseudônimo de Patricia Galvão, jornalista, escritora, participante da Semana de Arte Moderna de 1922, em São Paulo, cidade onde vivia e gostava de freqüentar bares usando calças compridas, fumando e com cabelos curtos à La garçonne. Conclusão: escandalizou a capital paulista, foi marginalizada, mal vista, etc. Atualmente, seus gestos, atitudes e comportamento viraram um lugar absolutamente comum. A segunda brasileira a destacar é Leila Diniz, que gerou um verdadeiro escândalo ao aparecer grávida de biquíni, numa época em que a gravidez, no Brasil, era vista ainda como uma doença. Hoje, todas as grávidas expõem sua barriga em público. Todas são um pouco Leila Diniz.

No campo das artes plásticas, vale lembrar que Vicent Van Gogh, célebre pintor expressionista, não conseguiu vender seus quadros enquanto viveu. E vivia em absoluta miséria, dependendo de favores de terceiros e da ajuda do seu irmão Théo. Morreu aos 37 anos, em 1890. Cento e dez anos após a sua morte, seus quadros são “verdadeiras minas de ouro”. Ou seja, são vendidos por preços altíssimos e se transformaram num investimento certo para bilionários no mercado internacional. Ter um Van Gogh é ter milhões de dólares em caixa! E há muitos outros artistas que já passaram por esta situação (terrível) de serem incompreendidos no tempo em que viveram. E o que leva pessoas de um determinado tempo, de uma determinada época a se chocar com uma determinada proposta artística? Sem dúvida alguma é a cultura, já que o ser humano é fruto do ambiente em que vive.



1.3 Arte e cultura

“O comportamento de cada ser humano se molda pelos padrões culturais, históricos, do grupo em que ele, indivíduo, nasce e cresce.” Faya Ostrower – artista plástica e escritora

É a cultura que vai determinar o que é arte válida, o que é arte não aceita, o que é bonito, o que é feio, num determinado momento histórico. Mas já vimos que comportamentos e atitudes não aceitos num determinado período podem ser aclamados num outro, pois tudo depende das mudanças culturais, que vão acarretar mudança nas cabeças, nas atitudes e na capacidade de julgamento das pessoas.

Mas quem será que decide o que é ou não uma obra de arte? A nossa sociedade delega este papel de crítico, ao historiador de arte, ao perito, ao restaurador/conservador do museu, ao marchand, aos diretores dos museus. São eles que conferem o status de arte a um objeto.

A cultura também prevê locais onde a arte pode se manifestar, locais que dão o status de arte a um objeto: as galerias e museus permitem que um pintor ou escultor exponha seu trabalho criativo. O local “enobrece” um objeto. O pintor, o escultor e/ou artesão que expõe, por exemplo, aos domingos, na Feira da Praça General Osório (Ipanema, zona sul do Rio de Janeiro) está fazendo parte de um circuito alternativo. Não está integrado num circuito artístico oficial. Pois cabe às galerias e museus “traçar” uma linha divisória separando os objetos artísticos oficiais dos “não oficiais”. Aos críticos, filósofos, estudiosos das artes plásticas e marchands cabe nomear quais são as obras interessantes, que valem um investimento, e as que “não são interessantes”. Resumindo, há um aparato cultural que “elege” as melhores peças artísticas de um momento histórico. E, assim, é sempre criada uma hierarquia dos objetos artísticos. Ou seja, quais são as melhores obras e as piores; quais são os mais destacados, criativos e inovadores artistas. Esses julgamentos são feitos o tempo todo. Mas vale frisar que todo crítico utiliza seus critérios pessoais no julgamento. O que ele faz é dizer que – segundo seus critérios – tal obra é melhor ou mais harmoniosa, mais bem realizada ou mais rica que a outra. E ao julgar, o critico está utilizando a sua cultura, pois as noções de beleza, de feiúra, de harmonia, de equilíbrio, ou seja, as noções estéticas, são subjetivas e dependem, inclusive, de uma afinidade entre a cultura do crítico e a cultura do artista. Obras polêmicas, obras vanguardistas, obras inéditas jamais conquistam um consenso. Mas este consenso da nossa indústria cultural também não é estável e nem eterno. Ele muda, ele evolui, assim como a cultura, no decorrer da história. Hoje, por exemplo, a sensibilidade do mundo ocidental e oriental está muito mais aberta para compreender a obra de Vicente Van Gogh. O juízo de hoje, como vimos, o consagra e vai até mais além: o torna um excelente investimento.

Cada época se interessa pela arte ou “enxerga” a arte de uma maneira diferente. A cultura inclui flutuações do gosto, flutuações no tempo. E a crítica ora exalta, ora desvaloriza ou “coloca no purgatório” uma obra de arte. A crítica é também inconstante, subjetiva, assim como os conceitos sobre o que é arte e os estudos sobre estética, que vem a ser, numa definição simplificada, uma filosofia que estuda as condições e os efeitos da criação artística. Em poucas palavras, cabe à estética fazer um estudo racional do belo, definindo, inclusive, o que é a beleza, o que é a feiúra, o que tem harmonia, dentro de um determinado tempo histórico, e numa determinada cultura. A estética também estuda as emoções e sentimentos que uma obra de arte pode suscitar no ser humano. Vale destacar que a estética – nas suas tentativas de conceituar a beleza – lida muito com dados subjetivos, com sensações e emoções. Ou seja, não há bases científicas sobre as quais pode um crítico, um estudioso, amparar seus conceitos. O que existe é uma sensibilidade depurada, um olhar “treinado”, que confere a um número restrito de pessoas o direito de afirmar o que é ou não arte. E é esse olhar depurado que subdivide a arte em estilos. E cada estilo guarda características de uma época. Você provavelmente já ouviu alguém formular a seguinte pergunta: “ de que estilo é tal pintor?”. Enquanto o crítico, o historiador, o restaurador, o marchand gostam, na maioria das vezes, de “rotular”, de “classificar”, de adjetivar, colocando tal ou qual etiqueta na obra de arte, há muitos artistas que “fogem” dessas rotulações, com medo de que elas limitem sua capacidade de criação. “Ele é impressionista? Ou será surrealista? È abstracionista?. O que será que ele é?”. A cultura, através de seus agentes oficiais (crítico, historiador, etc) anseia em rotular. E o rótulo, muitas vezes, pode empobrecer uma obra de arte. A arte é um produto que nos escapa, que tem um modo inesperado de se revelar. Para dominá-la, para tentar lhe impor limites, surgem as classificações, os estilos, as etiquetas, os rótulos. E nessa classificação são privilegiados os criadores que, parecem, aos olhos dos críticos, dos historiadores, enfim que parecem aos olhos dos seus contemporâneos, como mais importantes, segundo critérios culturais daquele momento histórico.

No próximo capítulo você terá a oportunidade de ver em detalhes as características de cada um dos estilos e sua influência na moda.


Capítulo dois - Arte & Moda

Você acredita que o vestir pode ser uma arte? É bem capaz de você considerar o vestir um simples ato cotidiano, feito passar água no rosto, escovar os dentes, escovar os cabelos ...! Mas se houvesse possibilidade de você se transportar para o século passado, ou melhor dizendo, para 100 anos atrás, sem dúvida iria constatar que o vestir era uma arte. E uma arte que encantava a todos os pintores. Havia um culto à indumentária, um culto à estética. Como bem afirmou o poeta Baudelaire, em meados do século XIX, “uma autêntica toilette vale um poema.” Havia arte na aparência, nos gestos e na roupa. O ato de compor um estilo exigia noções de harmonia e unidade, elementos também presentes na composição de um quadro. A moda era vista como uma arte aplicada, porque compunha um todo que representava harmonia nas cores, harmonia nas formas e harmonia nos gestos e movimentos. Havia um refinamento na forma e no estilo e uma busca consciente de uma linguagem das roupas. Era como se a roupa tivesse alma ... Daí tantos pintores célebres terem se aplicado em reproduzir as roupas de séculos passados. Em cada retrato que criavam eles se mantinham fiéis ao estilo de vestir difundido num determinado tempo histórico. Fascinados pela arte do bem vestir, eles eternizaram estilos.

Pintor célebre Edgar Degas foi um pouco “costureiro” ao imortalizar o ritual de vestir feminino em três quadros. O primeiro se chama “Chez La modiste” (numa tradução literal, na modista), foi pintado em 1882, se encontra no Metropolitan Museum Of Art, Nova York – EUA – e retrata uma mulher no momento em que prova um vestido submetendo-se ao ritual de ajustes de modelagem, mostrando a costureira realizando os devidos acertos no corte, adaptando-o ao corpo da sua cliente. O segundo, batizado de “Chez La couturière” (traduzindo, na costureira) foi pintado por volta de 1882-1883, e também se encontra no Metropolitan Museum of Art, Nova York, USA – e retrata o ritual da escolha de uma toilette. No terceiro quadro, “Madame Jeantaud devant um miroir” (numa tradução literal, madame Jeantaud na frente do espelho) que se encontra no Museu d’Orsay, Paris – França, o pintor Edgar Degas imortalizou uma jovem senhora no momento em que ela admira o resultado final de sua toilette, ou seja, do seu traje. E a moda do século XIX era uma arquitetura que dissimulava e modificava os corpos femininos, caracterizando-se pela acumulação de ornamentos e de complementos. Cabia à uma mulher elegante jamais sair de casa sem chapéu e luvas. Cabia à revista de moda, todas editadas em Paris (França), divulgar os últimos lançamentos.

No século XIX já existia, na França, uma forte imprensa de moda feminina. Fazem parte da história mundial da imprensa feminina as seguintes publicações: “La revue illustrée, L’art de la mode, La vie parisienne, Le petit courrier, Le journal des jeunes filles, La revue de la mode, La dernière mode, Le moniteur de la mode, Le magasin des demoiselles, la mode illustrée.”

E muitos pintores trabalhavam como ilustradores para estas revistas, sem assinar as ilustrações que hoje são vistas como autênticas obras de arte. O avanço da roupa industrializada, o “nascimento” da profissão de estilista, aquele que assina as suas criações, o surgimento da fotografia e do desenvolvimento, a partir do século XX, da arte abstrata: sem dúvida estas são razões que levaram o artista plástico a deixar de “retratar” a moda, .Neste capítulo, vamos ver os principais movimentos artísticos, incluindo o surgimento do impressionismo.

2.1 Renascimento

Renascimento, Renascença: ato ou efeito de renascer, vida nova. Fim da Idade Média, início dos tempos modernos. Idade de ouro das letras e das artes. Movimento artístico e científico dos séculos XV e XVI, que perdurou de 1400 a 1560. Periodo de grande desenvolvimento comercial e urbano.

Renascimento é um período marcado por musas, mulheres inspiradoras, que traduziam uma beleza serena, suave e lânguida. Para Sandro Botticelli a graça e a harmonia estão nas deusas da antiguidade grega. Na tela, “Marte e Vênus” (que se encontra na National Gallery, em Londres, Inglaterra) há a glorificação do humano, do pagão,do natural, em oposição ao divino, ao extra-terreno, típico da Idade Média.

A Vênus de Sandro Botticelli representa a beleza, essa beleza que buscavam os artistas e humanistas da Renascença. E há, em todo o quadro, um grande apelo à vida, à mitologia grega, à antiguidade e à beleza feminina. O nu casto é enaltecido, assim como o belo traje branco, vestido por Vênus,que não corresponde à moda da época, pois é inspirado na antiguidade grega e romana. Já os cabelos de Vênus estão penteados segundo a moda das jovens de Florença, que adoravam usar apliques trançados. Esse quadro, uma verdadeira alegoria mitológica, foi criado em 1483.

Mas a musa maior do período renascentista é, sem dúvida, a italiana Lisa Gherardini, que se tornou um símbolo da beleza e da feminilidade ao ser retratada por Leonardo da Vinci. O quadro “A Gioconda” – que vem a ser o sobrenome do marido de Lisa, Francesco Del Giocondo, no feminino – foi pintado por Leonardo da Vinci, o mestre do renascimento, entre 1503-1505, e ficou conhecido como “Monna Lisa”.

Monna em italiano arcaico significa Madonna, ou seja, senhora. Pode-se, então, dizer que Monna Lisa é sinônimo de Senhora Lisa

As novas técnicas, todas elas descobertas nesse período, estão presentes nesse quadro de Leonardo da Vinci, que se considerava um cientista. Ele imaginou máquinas volantes, estudou mecânica, geologia, ótica, hidráulica e muitas outras ciências, além de ter escrito um tratado sobre anatomia em que registra suas descobertas. Leonardo era um estudioso incansável, sempre em busca do novo. Na pintura, ele desenvolveu a técnica de esfumaçamento (sfumato, em italiano) em que procura “banhar” todo o quadro com uma neblina suave e evocativa, dando-lhe um “ar” de mistério. A técnica do “sfumato” e a técnica de diluir as distâncias, o que proporciona um sentido excepcional de profundidade, estão presentes no quadro Gioconda/Monna Lisa, onde há, também, um jogo de cores claras versus escuras e de cores quentes versus cores luminosas, muito sensual. Leonardo foi a maior figura da Escola Florentina, que surgiu na cidade de Florença, e marcou o período áureo da Renascença

Mas será que Leonardo da Vinci previu o sucesso que faria a sua Monna Lisa, que está exposta no Museu do Louvre, em Paris (França), e nunca se cansa de ser enaltecida e até cantada por vozes imortais como a de Nat King Cole? Afinal, muitas pessoas ainda se lembram do refrão “Monna Lisa, Monna Lisa, Monna Lisa”, que ecoou em todo mundo quando Nat King Cole evocou a Gioconda nos anos 50 do século XX.

E apesar de ter quase cinco séculos de vida, ainda é o quadro mais copiado do mundo e ser tornou um modelo de mulher, que serviu de referência a várias gerações de artistas. Nos primeiros anos do século XXI foi publicado um anúncio da Bom-Bril E do amaciante de roupas Mon Bijou onde o garoto propaganda da marca apareceu vestido igual a Gioconda ou Monna Lisa.

Além do sorriso, tido como enigmático, que virou uma marca de sensualidade, um outro aspecto que merece leitura é a roupa, os trajes de Monna Lisa. A Itália da Renscença cultuou o luxo. E o estilo italiano de vestir dominou, assim como as suas artes plásticas, em toda a Europa. A silhueta feminina desejada era cheinha, avantajada, se observada com os olhos da atualidade. Os tecidos e as formas eram pesados. Florença, Veneza e Milão possuíam uma excelente indústria têxtil. A moda era condicionada pela suntuosidade dos tecidos, que tornavam os movimentos mais lentos, embora marcados pela harmonia, palavra de uso corrente numa época em que os artistas estavam, sempre, em busca da perfeição. No quadro Monna Lisa pode-se ver, a olhos nus, que ela ostenta um tecido numa cor neutra/escura e pesado, numa simplicidade temperada com sofisticação, destacada pelo bordado na altura do busto. Os decotes arredondados pediam cinturas altas, conforme a tradição grega e romana, que predominou no período renascentista. As longas mangas (que podiam ser detalhadas por drapeados e recortes) eram as mais usadas.

Os chapéus, muito usados na Idade Média, são substituídos, na renascença, por penteados entremeados por pérolas ou realçados por diademas encrustados de pedras preciosas. Mas no quadro de Leonardo da Vinci, a Lisa Gherardini ou a Monna Lisa está com os cabelos lisos, soltos. Por cima dos cabelos há um véu transparente que destaca, ainda mais, o clima de mistério presente nessa obra prima mundial.

2.2 Barroco

Barroco: produção artística que nasceu na Itália, no final do século XVI. Depois, conquistou todos os países europeus, tendo sido transplantado para a América do Sul pelos espanhóis e portugueses, seus colonizadores. Como estilo perdurou até a metade do século XVIII.

A palavra barroco origina-se do vocábulo espanhol “barrueco”, que designa um tipo de pérola irregular e de formação defeituosa. Como estilo artístico, o barroco caracteriza-se pela busca da emoção, e pelo uso, nas artes plásticas, da profundidade, volumes e cores. Toda pintura barroca traz um forte contraste de luz e sombra, além de sempre enfatizar caráter cenográfico e ilusionista. Ou seja, um tipo de representação que, pelo uso de perspectiva arquitetônica, tem paredes ou tetos que ampliam o espaço, dando a impressão de uma amplitude maior. E o recurso ilusionista é chamado pelos franceses de “trompe l”oeil”.

Trompe l’oeil: engana o olhos, dá impressão de realidade. O verbo tromper, em francês, significa enganar.

No quadro “As meninas”, pintado em 1656 por Diego Rodriguez da Silva Y Velázquez, e que se encontra no museu do Prado, em Madrid (Espanha), foi imortalizada a moda espanhola feminina da contra-reforma, marcada também pela descoberta da América do Sul. As meninas do qudro de Velázquez são as damas de honra da corte espanhol. Elas, na tela, estão em torno da jovem infanta Marguerita, a filha do rei. O quadro retrata também o imortal pintor no momento em que faz,numa imensa tela bem iluminada e visível, o retrato do casal real.

No estilo de vestir das meninas reproduz o estilo adotado pelas suas mães, característico de uma época em que ainda não existia uma moda infantil. Elas, meninas, parecem umas anãzinhas em suas roupas austeras, de cores sóbrias/monótonas. O corpete é bem justo, cintura bem fina, mangas com detalhes. As saias tinham modelagem ampla nos quadris e eram marcadas por uma sobressaia rígida, feito uma crinolina, que provocava o volume “extra” nos quadris. Trata-se de um estilo severo e desconfortável, reflexo de uma época que não tolerava movimentos. O aspecto prático da roupa ocupava um lugar secundário O que contava era o seu aspecto decorativo. E a vestimenta escondia/mascarava as formas femininas.

Crinolina: tecido feito de crina animal, bem resistente, próprio para forro. Anágua de crinolina, usada para armar e entufar a saia.

Um fosso separava, também, a moda da corte da moda do povo, adepto (tanto homens como mulheres) de um estilo mais prático,já que necessitavam se mexer, se movimentar, pois trabalhavam e muito. Já os nobres da corte cultuavam o ócio. Por isto suas roupas eram tão pouco práticas, tão desconfortáveis, sobretudo o estilo feminino. Vale ressaltar que a criança era vista, pela sociedade da época, como um “adulto imperfeito”, as roupas das meninas e dos meninos eram, literalmente, uma réplica da roupa das mulheres e homens. A roupa jovem, que tanto sucesso fez na sociedade contemporânea, surgiu com força total no século XX, um século que enalteceu, como nenhum outro, a juventude. No passado, aconteceu o oposto. Ou seja, os jovens imitavam o estilo dos seus pais, já que não tinham um estilo que pudessem chamar de seu. E é isto que se vê no quadro de Velázquez: meninas vestidas iguais às suas mães. Atualmente, o que se vê é exatamente o contrário: são as mães que se vestem iguais às filhas. Hoje é proibido envelhecer. Já na época barroca o que se via eram meninas vestidas como damas da corte.

2.3 Neoclássico

Neoclássico: surge no final do século XVIII. Restaura as artes da Antiguidade Greco-romana. Seus valores estéticos são valores morais. O belo ideal é o que une a beleza dos corpos à beleza do espírito. Este estilo procurou expressar os interesses e a mentalidade da burguesia da época e da revolução francesa e do império napoleônico.

Importantes artistas do movimento neoclássico sonham em educar o público e desenvolver seu senso moral e cívico, e se inspiram na antiguidade Greco-romana para realizar, sobretudo grandes pinturas com motivos históricos, religiosos e mitológicos. Por outro lado, as telas que reproduzem cenas do cotidiano e os retratos dos burgueses consagrados, eram capazes de bem remunerar um artista. Menos solicitados eram os quadros com paisagens e natureza morta.

Jacques-Louis David foi um dos primeiros pintores neo-clássicos. Para ele, a beleza de Roma (capital da Itália) e seus monumentos antigos eram uma autêntica revelação. Em 1780, nove anos antes da revolução francesa, que ocorreu em 1789, David começou a fazer quadros com a história da antiguidade. E essas telas chamam a atenção pelas suas linhas fortes que guiam o olhar. Durante a revolução, Jacques-Louis David, politicamente engajado, colocou sua arte a serviço da França. E se torna, no poder, um observador privilegiado. Quando Napoleão Bonaparte conquistou o posto de Primeiro Consul, ofereceu a David sua proteção, nomeando-o primeiro pintor da corte.

A coroação de Napoleão está imortalizada num grande quadro de Jacques-Louis David chamado “A sagração do imperador Napoleão I”. A tela, pintada entre 1806-1807, mostra a coroação de Josèphine por seu marido, Napoleão Bonaparte, que admirava profundamente a antiguidade Greco-romana, e gostava de se imaginar um César ou um Alexandre moderno. Um dos seus emblemas era a águia imperial. No quadro de Jacques-Louis David, é traduzida toda a pompa que envolvia a corte napoleônica, e a figura de Bonaparte nos remete às imagens de César, na Roma antiga. A influência da Antiguidade também está presente na moda feminina, com suas cinturas altas,caimento lânguido, feito uma túnica.

Para Jean Auguste Dominique Ingrès coube imortalizar o homem de negócios, a burguesia triunfante, no retrato que fez, em 1832, de Louis-François Bertin, o fundador do jornal francês “Débats”. O quadro conhecido pelo nome de “M.Bertin” deixa bem à vista os trajes sóbrios do burguês bem-sucedido, que veste paletó e calças pretas, mais colete verde-musgo. O único toque de luz fica por conta da camisa branca. Na cintura, notem bem, já está o relógio, acessório que se consagra quando o burguês assume, também, o controle político, após a Revolução Francesa. O imortal poeta Baudelaire amava este quadro.

Para Baudelaire, a existência da tela “M.Bertin” era a prova do talento de Ingrés, “o único homem da França que realmente faz retratos.” E o consagrado pintor foi uma espécie de cronista visual da sociedade do seu tempo.

Outro retrato de Jean-Auguste-Dominique Ingrés é o de “Madame de Senonnes”, que se encontra no Museu de Belas Artes, em Nantes, França. O estilo de vestir da senhora Senonnes é fiel à moda da época da restauração, ocorrida entre 1815-1820, e que significa o retorno dos Bourbons (leia-se a família imperial francesa) ao poder, com a derrota de Napoleão. A cintura alta, que marcou a moda feminina durante o período de influência neoclássica, está presente no vestido de veludo em cor escura, com discretas transparências no colo, que deixam entrever parte do busto. Pescoço marcado por gola em renda, que também está presente nos punhos das mangas compridas. Nos dedos, vários anéis. Os cabelos negros estão presos e enfeitados apenas por uma tiara. Nesse período histórico, quem ditava as variações e mudanças da moda feminina era Paris (França), que já era vista como a capital da elegância, sobretudo do estilo urbano, das cidades, que se desenvolvem muito após a Revolução Francesa.

Vale destacar que Ingrés pintava ricaços e nobres só para pagar as contas no final do mês. Ele considerava o retrato um gênero menor da pintura e acreditava que a tarefa primordial da arte era produzir quadros históricos, com valores morais, conforme ditavam os preceitos neoclássicos.

E nos quadros que pintava para sobreviver, Jean-Louis-Dominique Ingrés era um detalhista, um perfeccionista ao reproduzir jóias, flores e panejamento dos tecidos, tão em voga naquela época.

2.4 Romantismo

Romantismo: movimento artístico onde predominam os valores emocionais sobre os intelectuais. Os artistas têm sentimentos nacionalistas e apreço pela Grécia contemporânea, participando dos acontecimentos sociais e políticos do seu tempo. Na pintura, há uma forte tendência para exagerar no colorido. Mas as formas são sintéticas.

“O pintor não deve retratar o que vê diante de si, mas também o que vê dentro de si mesmo”, declarou o pintor Caspar David Friedich da escola alemã do romantismo. Com estas palavras ele definiu a intensa preocupação com os sentimentos, que prevaleciam entre artistas românticos . Muitos destes artistas se inspiram, inclusive, em grandes escritores dramáticos, como, por exemplo, Dante, Shakespeare, Goethe Byron. E cada artista do período registra o seu tempo de acordo com a sua sensibilidade pessoal. A imaginação e o fantástico ocupam o primeiro lugar. É o predomínio dos sentimentos sobre o intelecto. Os artistas escolhem mostrar os episódios históricos que correspondem às suas sensibilidades.

O fundador do estilo romântico é o francês Théodore Géricaut. Precursor, ele imortaliza, nos seus quadros, fatos de vida contemporânea. Em 1815, Géricaut se inspirou na tragédia de um naufrágio para criar a tela ¨Balsa da Medusa¨ (Museu do Louvre, Paris – França ), que apresenta uma imponente composição em pirâmide, com náufragos nus, seminus ou apenas envolvidos num pano. O jogo de cores claras versus escuras/sombrias reforça o sabor trágico desta composição que não fez sucesso imediato junto ao publico.

Ao criar este quadro, Géricault demonstra que o mundo moderno pode fornecer grandes temas para a pintura histórica. Mas quem ganhou fama e expressou os sentimentos mais exaltados, como um autêntico romântico, foi Eugene Delacroix, um apaixonado por temas históricos, por grandes composições históricas. Ele participou da revolução ocorrida em Paris ( França ) em 1830, quando da queda do rei Carlos X. E esse episódio histórico lhe ofereceu a oportunidade de registrar o seu tempo no quadro ¨A liberdade conduziu o povo ¨, que se encontra no Museu do Louvre, Paris – França. Esta célebre tela celebra o combate da geração romântica pela liberdade, constituindo um panfleto político, que exalta a revolução de 1830. O quadro vale pela autenticidade, pelas cores, pelo jogo de luzes e sombras, tão característico do estilo romântico. O único personagem feminino presente nesta tela de Eugène Delacroix está com o busto de fora. Mas a sua nudez parcial é a nudez casta, como o nu da mitologia. E o seu vestido solto, com amarração na cintura e lateral, na diagonal, não segue a moda da época. Inspira-se, também, nas figuras mitológicas. E ela, uma heroína, segura a bandeira francesa, num ato de patriotismo. Sua mão levantada, com energia e segurança, parece dizer: ¨Allons...¨. Trata-se de dum convite à luta pela pátria. Os homens e o menino, todos armados, alguns caídos, feridos ou mortos; outros em pé. Todos, como povo que são, trajam o estilo ¨sans culotte ¨, numa tradução literal, sem calção.

Os calções eram exclusivos dos nobres e da corte, que gostavam de vestir com ostentação e luxo. Ou seja, seus trajes ( inclusive os célebres calções masculinos ) eram detalhados por bordados em pérolas e pedras preciosas.

Com a Revolução Francesa surge o estilo ¨sans culotte ¨que era a forma de vestir dos pequenos comerciantes, dos assalariados, do povo, enfim. E os burgueses, vitoriosos, queriam, de alguma forma, encontrar um estilo de vestir que caracterizasse o seu jeito de ser que os direrenciasse dos nobres. As calças compridas, que já faziam parte dos guarda-roupa dos ¨sans culottes ¨- conforme esta registrado no quadro de Èugene Delacrois – passam, cada vez mais, a traduzir a sobriedade do burguês, que não deseja chamar a atenção pela sua aparência física. Ele deseja, sim, atrair as atenções para a sua inteligência, para a sua cabeça, não para o seu físico. Para ele, nada melhor que a sobriedade do paletó/colete e calça em cores neutras/escuras e um corte que dispensa detalhes supérfluos. E estas, salvo pequenas alterações, são as linhas mestras da modelagem masculina até a atualidade. Um homem de negócios num terno bem cortado, bem modelado e feito num tecido de qualidade, é bem recebido em qualquer parte do mundo, seja no ocidente, seja no oriente. Porque seu traje sóbrio fala por ele, ou seja, ¨diz ¨quem ele é.

No estilo de vestir, o romantismo é marcado por uma preocupação com o passado. A burguesia não gostava, na época, de se glorificar da sua riqueza. Os homens estavam muito ocupados com os negócios, suas mulheres e filhas viviam para a vida do lar, para a vida doméstica. Em poucas palavras, foi uma época que não aceitou exibição no vestir: distinguir-se pela roupa era, para os homens, sinal de arrogância.

Atualmente, as mulheres independentes econômicamente, também gostam de adotar os ¨simbolos masculinos de representação da força e do poder. Trocando em miúdos é cada vez maior o contingente feminino adepto da austeridade no vestir, leia-se adepto dos blazers, das calças compridas, dos paletós,dos ternos pretos ou,, simplesmente, do sóbrio e discretíssimo tailleur. Podemos dizer que faz pouco tempo que a mulher conquistou o direito de ter uma carreira, uma profissão. E ao se profissionalizar, ela, por ainda não ter um modelo seu de sobriedade masculina. Também pode-se dizer que essas roupas sóbrias, essas roupas austeras e até um ¨visual militar ¨ tornaram-se uma mania contemporânea, já que a proteção contra um inimigo qualquer parece ser uma obsessão dos atuais tempos modernos, época marcada pelo crime de abuso sexual.

2. 5. Realismo

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Realismo: a pintura recusa o intelectualismo neoclássico e o emocionalismo romântico. Tem algum apego aos métodos científicos di criação e, sobretudo, propaga idéias políticas e sociais ao denunciar as injustiças, a exploração dos humildes e o contraste entre a miséria e a riqueza.

Para os pintores do movimento realista, o belo é o verdadeiro. Eles escolhem os temas dos seus quadros observando a realidade.

Quero fazer uma arte viva, traduzindo os anseios e idéias da minha época ¨. Com esta afirmação, Gustave Coubert, assumiu o compromisso de só pintar a realidade, ou seja, o que viu. Ele é o fundador do estilo realista porque foi quem primeiro externou solidariedade com a vida dos seus contemporâneos, assumindo um engajamento explicito.

O quadro ¨Enterro em Ornans¨, pintado entre 1849-1850, e que se encontra no Museu d’Orsay, Paris – França, pode ser considerado o precursor do movimento realista. Com mais de seis metros de comprimento, tamanho até então exclusivo dos quadros históricos, o ¨Enterro sem Ornans¨é uma imensa composição onde os protagonistas são pessoas comuns, mostradas exatamente como eles são, com suas roupas de todo dia, seus rostos banais. Coubert utiliza um formato de quadro histórico para retratar uma cena da vida cotidiana.

No quadro em questão, a cena é de um enterro em Ornans, que vem a ser a cidade natal de Gustave Coubert. Em volta da cova aberta, estão o padre da paróquia da cidade e a mãe e as irmãs do pintor. Elas, como as demais mulheres, vestem roupas pretas, austeras. A maioria delas usa na cabeça touca ou pano preto. Algumas usam toucas brancas, o que dá um toque de luz e quebra o tom escuro, sinistro, que domina a tela. Para os homens, os paletós coletes, calças, conforme a moda da época. A maioria está também de preto. O toque iluminado fica por conta das camisas brancas e de uma perneira ( de inspiração militar ) também branca. No primeiro plano, há um senhor que se distingue dos outros porque está com um paletó ( tipo fraque ) e calça verde-musgo. O colete é marrom.

Apresentado ao público e aos críticos de arte em 1850, o ¨Enterro em Ornans¨provocou um escândalo. ¨Como Coubert ousou pintar um fato do cotidiano num tamanho de quadro histórico?¨. Esta era a pergunta que corria de boca-em-boca em Paris. Em 1855, os quadros de Gustave Coubert são recusados na mostra de arte da 1ª Exposição Universal de Paris.

Proibido pelos Críticos de arte de participar da Exposição Universal, Gustave Coubert decide mostrar seus quadros numa mostra paralela, que ele batiza de ¨Pavilhão do Realismo¨. Ao combater as convenções da então arte oficial, adotadas pela Escoda de Belas Artes e consagradas do Salão de Paris, Gustave Coubert criou o realismo, um movimento importante,um estilo frutífero, que trouxe nova visão plástica do mundo.

Para sobreviver, Coubert ministra aulas de pintura. E ele sempre aconselha seus alunos a ¨pintar coisas reais e relevantes¨.

De origem rural, Jean-François Millet se especializou em retratar a existência difícil dos componeses, numa época marcada pela revolução industrial e, consequentemente, pelo êxodo das populações rurais, que trocam o campo pelas cidades industriais, em busca de novos trabalhos e maiores ganhos. Millet tinha uma posição política e social a favor do povo. Ele dizia: ¨Cada época tem a sua poesia. Cabe ao artista descobri-la e traduzi-la¨.

Para Millet, a poesia estava no trabalho de mulheres e homens do campo. ¨Os plantadores de batata¨, ¨o semeador¨: estes são os títulos de alguns dos seus quadros, onde ele evoca as imagens do campo. No quadro ¨Des glaneuses¨, pintado em 1857 e que se encontra no Museu d’Orsay – Paris, França – Jean-François Millet mostra as camponesas colhendo trigo. Elas estão trajando vestidos ou sasea e blusa em tecido rústico. Os complementos são um avental e um lenço amarrado na cabeça. Vale ressaltar que a ausência de chapéu as caracterizavam como mulheres do povo. Cheinhas, elas deixam suas silhuetas ( típico da época ) livre dos espartilhos, que limitavam os movimentos, dificultando o trabalho, sobretudo braçal de plantar e colher. O uso do espartilho era restrito às moças e senhoras burgresas, que viviam para o lar.

2. 6. Impressionismo

Impressionismo: Nasceu em 1874, em Paris, França. Veio diretamente do realismo de cujo espírito científico se impregnou.

O pintor impressionista foi um observador atento do seu tempo e imortalizou cenas que mudam incessantemente.

Para os impressionistas, a forma é obtida através das vibrações luminosas das cores que mudam incessantemente.
Os olhares desatentos é que não percebem as mudanças da cor de acordo com a incidência da luz solar. Os efeitos plasticamente dinâmicos do estilo impressionista são obtidos através do emprego das cores e de suas relações e contrastes. Esse estilo, por suas inovações, influiu profundamente na pintura do século XX.

Os impressionistas ao deixarem os antigos ateliês de pintura, tão usados por seus antecessores, passaram a pintar as grandes avenidas francesas, as ruas de festas, pois queriam imortalizar a vida do jeito que ela se permitia ser vista. Queriam retratar a luz do momento e adoravam estudar mudanças de luz. Nas suas telas, os personagens integram a paisagem ou o ambiente. O surgimento da tinta em tubo facilitou o deslocamento dos pintores, que viviam intensamente o seu tempo. Afinal, para os impressionistas, a melhor inspiração para a realização de um quadro eram os fatos, hábitos e costumes da época.

Uma tela de Claude Monet chamada ¨Impression, soleil se levant¨numa tradução literal, ¨Impressão, sol nascente, gerou o nome Impressionismo.

No quadro ¨Mulheres no jardim¨de Claude Monet, realizado em 1866, ( que se encontra no museu d’Orsay, Paris – França ) quatro mulheres são retratadas do exato momento em que colhem flores do campo para fazer buquês.

Seus vestidos, melhor dizendo, suas ¨toilettes¨traduzem o rigor do bem se apresentar que era exigido do todas as moças e senhoras de família.

Para um passeio a pé, uma moça deveria usar um vestido com ombros e busto cobertos ( decotes discretos só à noite...! ) e saias bem amplas, valorizadas pelas sobressaias e crinolina. Chapéus e sombrinhas eram acessórios indispensáveis no culto ao rito das vestimentas, que exigia tempo disponível. Afinal, dava trabalho vestir saias, sobressaias, corpetes, anáguas, etc.

Toilette: numa tradução literal do francês significa traje, vestido enfeite, preparo individual.

E nesta época, uma mulher que gostava de se apresentar bem, necessitava ter sete a oito ¨toilettes¨por dia. Ou seja: de manhã, vestia o ¨robe de chambre¨, para passear ou sair a pé, uma ¨toilette¨completa ( exemplo: quadro ¨Mulheres no jardim¨de Monet ); para andar à cavalo, outro modelo de roupa, com algum leve toque de amazona, nem que fosse no chapéu ou apenas no chicote; para fazer uma visita, que poderia ser de condolências,de nascimento, de celebração de algum fato, etc. Se fosse jantar na casa de amigos, outro modelo.

Ombros à mostra ou discretos decotes eram permitidos ( e até desejados ) nos vestidos para ir ao teatro ou para ir aos espetáculos. E ainda havia a ¨toilette¨de caça para as mulheres que gostavam de acompanhar seus maridos na prática deste esporte, que era exclusivo da aristocracia e da alta burguesia.

Robe de chambre, traduzindo do francês significa roupão de quarto. No Brasil, ainda se usa muito a palavra peignoir que vem a ser roupão de senhora, além de ter o significado de penteador.

Para as mulheres dos anos 60 do século XIX, a cor do vestuário carregava um forte componente simbólico. As jovens escolhiam tons suaves, leves, como o branco, o marfim, o branco sujo, o bege claro – conforme pode ser observado no quadro ¨Mulheres no jardim ¨ de Claude Monet. As mulheres na faixa dos vinte e vinte poucos anos ( o que já era, na época considerada, idade da responsabilidade, de criar filhos, administrar um lar ) usavam vermelho. Já a cor preta ficava restrita às mais velhas, lembrando que, na época, trinta anos já era considerada, ¨idade avançada¨para uma mulher.

Coube a Pierre-Auguste Renoir, retratar uma senhora de preto. O quadro se chama ¨Retrato de uma mulher ¨ou ¨Retrato de madame Hartmann¨, foi realizado em 1874, e se encontra no Museu d’Orsay, em Paris, França, que abriga as melhores telas do estilo impressionista.

O volume – detalhe que foi uma constante na moda feminina do século XIX – desta vez está nas laterais e, sobretudo, mas costas, ou melhor dizendo, no bumbum, marcado por um imenso laço. As anquinhas ( que os franceses chamavam de ¨crinolinette¨) podiam tomar a forma de um imenso ¨pouf¨, nas costas. Um parêntese: a moda feminina do século XIX foi projetada para dissimular os corpos das mulheres. A modelagem se caracterizava pelo excesso do volumes: imensas saias, sobressaias, crinolinas, drapeados, ¨pouf¨ no bumbum, etc. Mascarava/dissimulava busto, ancas, quadris.Fecha parêntese.

Afinal, a sociedade da época era cheia de ¨falsos¨pudores, quando o assunto era mulher. E havia vários livros – escritos pelas mulheres da aristocracia – como os ¨códigos¨do saber viver (¨savoir-vivre¨, como dizem os franceses ) e dicas de como se comportar. Esses livros tinham uma consumidora certa: as mulheres da pequena e média burguesia, que imitavam a aristocracia, na esperança de atrair as atenções de um homem bem sucedido, leia-se um ¨bom partido¨.


Capitulo três O rompimento da arte como representação da realidade

Quando a moda deixou de ser a grande referência para os artistas plásticos?
Não existe uma data precisa. Mas, com certeza, o reconhecimento do costureiro como um criador de moda e o nascimento do estilo abstrato na arte acentuam o processo de afastamento do pintor, do artista plástico da moda.

Arte abstrata é aquela cujas formas e cores não possuem relação direta com formas e cores da realidade visual. No abstracionismo o artista se revolta contra a precisão da vida moderna, o racionalismo e a civilização.

Mas a moda ainda foi fonte de inspiração para os pintores do estilo impressionista. Claude Monet e Pierre Auguste Renoir chegaram a freqüentar ateliês de moda para “aprender a compor uma toilette”. E se encontra no Metropolitan Museum of Art, em Nova York – EUA, o quadro “Madame Charpentier e suas filhas” de 1878, onde Renoir imortalizou um vestido criado por Charles Frederick Worth. Vale, porém, destacar que a roupa de “Madame Charpentier “ não está muito nítida. Na busca de novos resultado plásticos, um das características do movimento impressionista, há uma atmosfera criada pelo uso de luzes e sombras e pelo contraste de cores complementares. Conhecido como um dos maiores “coloristas” da história da pintura, Renoir oferece pouca nitidez ao vestido criado por Worth. Suas pinceladas rápidas deixam à vista apenas o contraste entre o preto da saia e o branco dos babados ou frous-frous de uma sobressaia que se destacam na barra do vestido. Definitivamente não dá para sentir a textura do tecido e nem para ¨captar¨a modelagem do vestido. No passado, como já vimos no capítulo anterior, pintores como o neoclássico Jean-Auguste-Dominique Ingrés ou o romântico Eugène Delacroix, reproduziram em seus quaddros-retratos, o estilo de vestir vigente com total nitidez.

Assim como o estilo impressionista estimulou o aparecimento da arte abstrata, da arte moderna, o surgimento dos primeiros desfiles de moda, criados e organizados por Charles Frederick Worth, no seu ateliê, abriu o caminho para o reconhecimento do costureiro como um criador de moda, etilos e comportamentos.

E Worth não era nada modesto. Ele era um artista que sabia se valorizar. Gostava de se comparar aos grandes pintores e declarou, no século XIX, que compor uma roupa é como compor um quadro. Foi mais além quando afirmou que assinava a arte do bem vestir. E finalizou dizendo: ¨sou um grande artista. Tenho as cores de Eugène Delacroix... Meus pincéis são a minha tesoura!

3. 1. Arte-moda. Moda-arte

Considerado o Pai da alta-costura, Worth dominou o cenário da moda desde meados do século XIX até as novas linhas delgadas do início do século XX. Antes dele, o alfaiate, a costureira ou o comerciante de moda trabalhavam em ligação direta com o cliente. Ou seja, de comum acordo elaboravam a toalette e a cliente fazia valer o seu gosto e suas preferências, orientando o trabalho do profissional de moda. Charles Frederick Worth mudou esta realidade ao montar os primeiros desfiles de moda. Ele apresentava os seus modelos, suas criações. Cabea a cada cliente esscolher, entre os modelos apresentados,aquele que mais lhes agradava. Inicia-se com Worth o poder doscostureiros. De uma era em que a cliente coopera com o costureiro, a partir de um modelo em suma fixo, passou-se a uma era em que o vestuário é concebido, inventado de ponta a ponta pelo profissional, em função da sua inspiração e do seu gosto. Com Worth o costureiro adquiriu o direito de legislar livremente em matéria de elegância.

Antes de Worth, trajes por sua plasticidade se transformaram em peças antológicas, que contam um pouco dos hábitos, cores e formas que marcaram a história.

O traje de Monna Lisa de Leonardo da Vinci pode ser um exemplo. Quem o criou? Ninguém sabe. Provavelmente um ¨tailleur de ville¨, numa tradução literal, um alfaiate da cidade. Ele surgiu, a Europa, com o desenvolvimento urbano nos séculos XII e XIII. Era um artesão reconhecido, mas nenhum nome ficou para a história. Pois, durante séculos ninguém admitia ser possível reivindicar, na concepção e confecção de roupas, o reconhecimento de um trabalho artístico. A indumentária dos poderosos do passado chegou até nós por intermédio da pintura e da escultura, estas, sim, consideradas arte maior, onde o autor assina o que faz.

Daí, a importância de Charles Frederick Worth que fez a passagem da moda artesanal e historicamente anônima, para a moda de um novo tempo, ou seja a moda assinada, a moda pós revolução industrial e a sua ( posterior ) fabricação em série.

Quando realizava seus primeiros desfiles, por volta de 1860, e impunha seus modelos e seus gostos, Worth anunciava esses novos tempos, com o surgimento da indústria da moda que tem na câmara da alta-costura ( fundada no ano de 1868, em Paris – França ) o seu laboratório, já que todas as outras formas de fabricação que aliás hoje dominam o mundo, são em série.

Ao ditar o uso, o gosto e a seleção de peças do vestuário, Charles Frederick Worth impunha valores estéticos e determinava o que era bom gosto, Ele era um ávido colecionador de arte. Mas não costumava se inspirar nas artes plásticas ao criar as suas coleções.

3. 2. A arte inspira a moda

Já o Jacques Doucet (1853-1929) que abriu, em 1875, uma casa de alta-costura em Paris, usou pinturas dos séculos XVII e XVIII como fonte de inspiração para suas coleções de vestidos de baile. Doucet utilizava rendas, musselina, cetim e seda e não poupava seus vestidos de ornamentos. Pode-se afirmar que Jacques Doucet foi o primeiro estilista a utilizar, oficialmente, as artes plásticas como fonte de pesquisa e de criação das suas coleções, invertendo o processo. Ou seja, se, antes, os artistas plásticos se inspiravam na moda, com Doucet a moda começa a se inspirar na arte.

Vale ressaltar que o século XIX assiste ao nascimento da fotografia. A Sociedade Francesa de Fotografia é criada em 1858/60. À medida que a técnica se desenvolve, melhoram a qualidade dos retratos e nasce a profissão de fotógrafo, grande responsável pelo mundo das imagens, que vai ser plenamente desenvolvido no século XX. O século XXI então é dominado pelas imagens ...!

Ex-assistente de Jacques Doucet, a estilista Madeleine Vionnet (1876-1975) abriu sua “Maison” em 1912. Sua maior especialidade, o que a celebrizou, foram os vestidos que se amoldavam ao corpo, com perfeição. Vionnet foi a mestra do corte enviesado, a mestra do drapeado. Ela encomendava seus tecidos com quase dois metros a mais de largura, a fim de esculpir seus drapeados. Suas formas simples também se caracterizavam pela ausência da cor em vestidos cortados inteiriços, sem cavas. Muitas das suas peças eram vestidas pela cabeça, pois não tinham abotoamento. Madeleine Vionnet se consagrou pelas suas formas helênicas, clássicas, inspiradas na antiguidade grega. Seus tecidos prediletos eram o crepe, o crepe da china, a gabardine e o cetim

Também ex-assistente de Jacques Doucet, o estilista Paul Poiret foi quem “afrouxou” a silhueta formal da moda, subiu a cintura e obteve uma forma mais confortável, reduzindo o número de roupas íntimas e também de saias e sobressaias. Seus vestidos lembram o estilo adotado no período neoclássico, só que com alguns toques orientais, traduzidos nos turbantes e em algumas calças de odaliscas. Poiret procurou promover o uso destas calças bufantes, inclusive quando viajou pela Europa, com um grupo de modelos para apresentar as linhas básicas da sua coleção. Em 1013 ele realizou uma turnê pelos Estados Unidos, com o objetivo de divulgar e vender o seu estilo marcado pelas cinturas altas ou cinturas neoclássicas.

Os vestidos de Paul Poiret fizeram sucesso, alcançaram alta aceitação. Mas quando estourou a Primeira Grande Guerra ele fechou sua “Maison” e alistou-se no exército francês.

Finda a guerra, quem se consagra é Gabrielle Coco Chanel (1883-1971), a estilista que traduziu os novos anseios femininos. Suas roupas eram feitas com menos forro para ficarem mais leves e menos rígidas e, definitivamente, dispensavam o uso do espartilho. Foi Chanel quem lançou roupas elegantemente simples, pois para ela “o belo sempre precisa coabitar com o ÚTIL, favorecendo a liberdade de movimento dos corpos.”

Gabrielle Coco Chanel simplificou a silhueta feminina, retirando os ornamentos supérfluos, de luxo explícito. Ela teve como fonte de inspiração o guarda-roupa masculino. Criou o vestido-chemisier simples, produziu Cardigans , blazers e twinset . Ela própria só usava as roupas que havia adaptado de peças tradicionais masculinas como, por exemplo, camisa simples com gola aberta, capa de chuva com cinto, etc. Suas cores prediletas eram o cinza, azul-marinho e o bege. Ou seja, tons sóbrios. Chanel inventou o guarda-roupa prático, minimalista (inclusive nas cores) que dominou todo o século XX. E ela amava as artes plásticas mas considerava que a costura não é uma arte e sim uma profissão. Chanel não utilizou as artes plásticas como fonte de inspiração, mas encantou artistas, particularmente o francês Jean Cocteau que desenhou para a revista Elle (francesa) a inconfundível silhueta esguia, de seios pequenos, de Coco Chanel.

No seu desenho, Cocteau imortalizou um vestido de noite, criado em 1937, que apresenta a modelagem simples que tornou Chanel famosa: decote em U, bijuterias substituindo as jóias e o laço adornando os práticos cabelos curtos.

Enquanto Chanel diminuiu o gosto pelo ornamento com suas formas simples e funcionais que encarnavam os valores da era do progresso, a italiana Elsa Schiaparelli (1890-1973) fundiu, de maneira moderna e irreverente, arte com moda.

3.3 Os estilos na moda

O estilo cubista e o estilo surrealista influenciaram as criações de Elsa Schiaparelli, que contratou os artistas Salvador Dali e Jean Cocteau para desenhar acessórios, leia-se broches e chapéus. Ao reunir, com muito talento, moda e arte como uma mesma expressão artística, Schiaparelli afirmou, nos anos 30, que não havia lugar a arte separada da vida. Trocando em miúdos para ela não pode haver coisas belas só para serem admiradas e coisas úteis para serem usadas, vestidas. Para Elsa a arte faz parte da vida. Para quem se chocava com as suas declarações, ela perguntava: Por que vocês acham que sou louca quando coloco arte nos meus vestidos? Ao utilizar a arte como uma arma de sedução para combater o sentimento conformista que dominava a Europa antes da Segunda Grande Guerra, Elsa mostrou que a ligação da moda com a arte pode ser bela e positiva.

Para ela, a moda e arte possuem em comum a escolha de um tema, a questão do volume, do espaço , do uso da cor, da utilização do movimento e a importância da forma. A sua moda provocativa,irreverente, gerou em 1938, o vestido de baile com uma lagosta estampada,inspirada num quadro de Salvador Dali. O vestido com bolsos-gaveta também é baseado num quadro de Dali, assim como o chapéu-telescópio. O marchand francês Julian Levy chegou a declarar, em 1936, que Elsa Schiaparelli era a única estilista que compreendia, amava e difundia o movimento surrealista. Colorista brilhante, Schiaparelli tomou um dos tons de rosa utilizado por alguns surrealistas pioneiros, quando realizavam experimentações de cor, e lhe deu o nome de rosa-choque também conhecido como rosa-fúcsia, uma cor que traduz a irreverência permanente, a espiritualidade de Schiaparelli, uma estilista provocativa, que criou uma moda cheia de imprevistos, cheia de vida.

Cubismo – Tendência artística surgida por volta de 1908, que considerava a obra de arte um fato plástico independente da imitação direta das formas naturais e que se propunha a traduzir sua visão com a ajuda de formas geométricas.

Surrealismo – Ao escrever, em 1924, o manifesto surrealista, André Bretón afirmou que a pintura surrealista deveria expressar o inconsciente, sem sofrer controles da razão. Um segundo manifesto escrito em 1929 - ano em que ocorre o crack da bolsa de Nova York, que leva o mundo a entrar em depressão econômica – declara que os surrealistas só devem obedecer ao prazer de criar, sem ter compromisso com o real, o palpável.

Após Elsa Schiaparelli quem melhor realizou a relação moda e arte foi o estilista Yves Saint Laurent. Nascido em 1936 na Argélia, Saint-Laurent abriu sua Maison em 1962 e três anos depois, ou seja em 1965, fundiu a arte à moda em seus vestidos-tubos que trouxeram uma livre interpretação das telas de Piet Mondrian (1872-1944), pioneiro do estilo abstrato.

Arte abstrata – surgiu no inicio do século XX e se opôs , por definição, à arte figurativa, que dominava todo o espaço de expressão das artes plásticas. Sem compromisso em retratar o real, liberados da ditadura das naturezas mortas, dos retratos, os pintores abstratos assumiram um compromisso com o espiritual em quadros que reproduzem a viso do artista, o seu imaginário, pois a fotografia já havia assumido o compromisso de reproduzir e traduzir o real.

E o vocabulário artístico de Yves Saint Laurent é vasto. Após homenagear Mondrian, ela passa a utilizar , com muita freqüência, as artes plásticas em suas coleções. Em 1966 cria um estilo op-art, com a sua interpretação dos conceitos libertários dos anos 60, mais precisamente de maio de 1968, data de uma célebre passeata estudantil em Paris, cujo slogan foi “a imaginação no poder”. Em 1977, Saint-Laurent homenageia os pintores Diego Velázquez e Eugéne Delacroix. No ano de 1980 ele cria um estilo baseado em Henri Matisse. Oito anos depois, ou seja em 1988, Saint-Laurent homenageia o célebre Van Gogh, o estilo expressionista e o cubismo na sua coleção primavera-verão.

Ao utilizar, com freqüência a arte como fonte de inspiração, Yves Saint-Laurent abriu caminho para muitos outros estilistas, que observando o seu sucesso, seguiram os seus passos. Vale ainda destacar Pierre Cardin, Paco Rabanne e André Courréges que desenvolveram, nas décadas de 60 e 70, o estilo futurista. O branco imaculado, o branco puro, símbolo da pureza, foi a cor que Courréges utilizou na sua coleção futurista de 1965, onde ele prestou uma homenagem às ciências, ao espírito humanista e às descobertas espaciais, com a chegada do homem à lua.

Já Pierre Cardin utilizou as abstrações geométricas , tão comuns na arte moderna, para desenvolver linha, volume e modelagem dos seus vestidos, que apresentavam um equilíbrio perfeito. Na época, Cardin afirmou que a imensidão do universo e a geometria da arte abstrata eram a sua fonte de inspiração. E conclui dizendo que a sua roupa era uma justa homenagem à descoberta espacial, à imaginação de todos os pintores modernos... Afinal, para ele, sua roupa era a roupa do amanhã.

E o Paco Rabanne fez uso do metal, de placas de metal em roupas que traduziam a sua visão futurista, onde as amazonas do século XXI apareciam não protegidas e sim liberadas ou ornadas pelos vestidos em metal. Este estilo que celebrizou Rabanne foi, na época, duramente criticado por Gabrielle Coco Chanel, que dizia: isso não é uma costura, e sim uma metalurgia...¨ Para Paco Rabanne seu estilo fez sucesso, foi consagrado pela industria de moda porque traduziu o passar do tempo e se inscreveu numa lógica histórica, no curso do tempo, ao tentar prever o amanhã. Mas sem dúvida os vestidos-tubos curtos, ou seja, acima dos joelhos, em metal com linhas geométricas, pareciam uma sátira, uma abstração das antigas armaduras . Em 1989 Rabanne declarou que a moda e a arte possuem em comum o desejo de provocar... Em sua coleção de 1992 Paco Rabanne denunciou o abuso da sociedade de consumo ao criar uma túnica ecológica, feita de garrafas de plástico... Para ele, este foi mais uma roupa-objeto, onde a originalidade residia na originalidade do material empregado.


3. 4. A moda discute a arte

¨ Afinal, a arte é só para ser vista? A moda é só para ser vestida? ¨ Viviane Westwood – estilista inglesa.

Segundo a estilista inglesa Viviane Westwood, a moda atual, a moda do nosso tempo pode ser muito bem encarada como uma arte viva, que tende a captar a força e a harmonia da alma feminina. Ela sempre faz modelos, criações exuberantes porque busca novos caminhos, se insurgindo contra o estilo minimalista e a tendência à simplificação excessiva. Aliás, a Vivienne enxerga esta necessidade, constante, de simplificar como um medo à falta de gosto, um medo ao engajamento. “Nosso tempo é negligente. Consequentemente, nossas roupas são medíocres, óbvias demais”, afirma a estilista inglesa. Para Westwood é preciso que a arte seja uma fonte constante de inspiração, porque se há um passado a explorar, o estilista jamais ficará curto de idéias. Retratos, representações femininas dos séculos XVIII e do século XIX estão sempre presentes nas coleções desta inglesa inquieta, ávida colecionadora, assídua freqüentadora de museus e galerias de arte. Vivianne afirma que observa as obras de arte com atenção, registra a essência e logo abandona rápido o quadro que a tocou para, em seguida, reinterpretá-lo numa coleção ou numa campanha publicitária da sua etiqueta.Do quadro, ela afirma que só conserva, no final, a idéia geral e o clima.

Numa das suas campanhas publicitárias Westwood utilizou o quadro “Balsa de Medusa” do pintor romântico Théodore Géricault. O fato histórico, o naufrágio contado na tela é utilizado, pela estilista, para provocar uma reflexão sobre o nosso naufrágio contemporâneo, a crise de identidade provocada pela globalização. Que somos? Para onde vamos? Estas são as perguntas que Vivianne desejou colocar no ar no momento em que o célebre quadro de Gericault é evocado, como um fato histórico, numa das campanhas da marca de Westwood.

Camisetas-telas, camisetas-quadros também já foram criadas por Vivianne Westwood e hoje estão espalhadas por todo o mundo ocidental e oriental. Quem já não viu uma camiseta com um quadro de Claude Monet ou de Vicent Van Gogh estampado? Ao conquistar o gosto da maioria das pessoas (homens, mulheres e crianças), as camisetas-quadros ou camisetas-molduras de célebres telas chegam a ser produzidas em apenas cinco minutos em grandes shoppings centers. É só escolher o quadro, o pintor da sua preferência e aguardar a loja estampar, rapidamente. Estas camisetas, quando foram criadas, eram sinônimo de status. Hoje estão difundidas , industrializadas, mas continuam tendo um público-consumidor garantido.

No Brasil, além das camisetas-molduras de quadros famosos, que podem ser encontradas na maioria dos shoppings centers, há alguns estilistas que trabalham, com seriedade, a relação de moda e arte. Colecionador e admirador das artes plásticas César Coelho Gomes, proprietário e estilista da etiqueta Swains, especializa”A moda vê a arte”, realizada no shopping Center Fashion Mall na zona sul do Rio de Janeiro. Na ocasião, ele apresentou um sapato inspirado nas telas de Piet Mondrian, que se destacava pelas suas linhas geométricas, com retângulos. Fez tanto sucesso que este sapato tornou-se um clássico, sempre há pedidos, encomendas. Trata-se de um modelo que vende bem o ano todo. Atualmente, além deste modelo, César Coelho também criou sapatilhas, bolsas (inclusive as pequenas, gênero pochette), mochilas, sandálias, etc. A sua fonte permanente de inspiração são os quadros de Mondrian e de Joan Miró. O estilista Marco Sabino descobriu a relação da moda com a arte na Europa, na época em que foram lançadas as coleções do relógio descartável Swatch com mostradores que reproduziam quadros de célebres pintores como, por exemplo, Jackson Pollock, um dos grandes nomes do estilo expressionista e da arte abstrata.

Esta coleção da Swatch, lançada no inicio dos anos 80 do século XX inspirou Sabino a criar, no Rio de Janeiro, a exposição Marco Sabino e a arte assinada. Pintores da geração 80 (formada na escola do Parque Lage, bairro do Jardim Botânico) foram convidados a pintar um brinco-argola apenas respeitando o seu gosto pessoal. Participaram deste evento os pintores Jorge Barrão, Ricardo Basbaun, Alexandre da Costa (que vem a ser o filho de Milton da Costa), Guilherme Secchin, Claudia Duque, André Costa e Paulo Barreto. A seguir, Marco Sabino reuniu outros artistas plásticos (Cicero Cavaleiro e Marilena Serejo) e juntos realizaram uma exposição de acessórios que traduziam uma homenagem aos 100 anos da abolição da escravatura. Na década de 90, Marco promoveu duas novas exposições. Na primeira, o tema foi as cores de Jamaica e dela participaram os pintores Patricia Bowles, Walter Marques e Mata Augusta Rebouças que deram novas formas plásticas às bijuterias em cores quentes, cores da América Central. A segunda exposição fez uma homenagem aos 500 anos da descoberta da América, traduzida em peças com as cores, formas e a linhas com os ícones americanos, inclusive Marilyn Monroe. E ainda teve mais uma exposição feita por Marco. Foi a criação de uma coleção de acessórios inspirados na nossa arte primitiva, nos cartões postais e nas pinturas/paisagens que ainda encontramos pintadas, por artistas muitas vezes desconhecidos, em paredes de bares e botequins. Segundo Marco Sabino, no exterior valorizam muito esta relação do estilista com o artista plástico, com o pintor. Aqui, ainda estamos engatinhando, começando, devagar.

Fã de carteirinha do pintor impressionista Claude Monet, a estilista Ethel Moura Costa,da etiqueta Bijou -Box, se inspirou no célebre quadro “Le Jardin de Giverny” para criar um chapéu de palha que faz o maior sucesso na loja Bijou-Box no bairro de Ipanema, Rio de Janeiro. Ethel destacou que este modelo de chapéu de palhinha era o preferido do célebre pintor, que o usava todos os dias. E no quadro em questão, onde o pintor retrata um lanche no jardim de Giverny, o tal chapéu de Monet, que serviu de fonte de inspiração para a Ethel , se encontra pendurado num pessegueiro.


Capítulo quatro: A arte e a indústria têxtil

O tecido é um espaço pictórico autônomo, antes de ser um quadro ou uma roupa. Palavras de Emilio Pucci, estilista italiano.

No capítulo três analisamos, intensamente, o momento em que o estilista se apropria da arte e reproduz estilos artísticos em suas coleções, transformando, muitas vezes, uma roupa numa obra de arte. Ou seja, cria peças que reproduzem total ou parcialmente quadros consagrados.

Mas com o crescimento do mercado prêt-à-porter, o estilista sente a necessidade de diferenciar cada vez mais suas coleções. E criar estampas exclusivas torna-se uma maneira de diferenciar uma etiqueta das demais, num cenário industrial onde a cada dia surgem novos criadores de moda. Coube ao italiano Emilio Pucci desenvolver uma idéia genial, que vem a ser a criação de estampas exclusivas, que se tornaram uma marca registrada de sua etiqueta. E Pucci consagrou-se mundialmente com os seus vestidos, blusas, calças, saias, camisas que tinham linhas clássicas, mas, traziam um único diferencial: a estampa abstrata, rica em cores (tão ao gosto dos anos 60/70) e baseada em formas geométricas, ou seja, em triângulos, cones, círculos, etc.

Prêt-à-porter – expressão francesa para o ready to wear norte-americano. Indica roupa comprada pronta e foi criada no final dos anos 40, início dos anos 50.

Após Pucci o tecido-arte, o tecido-tela ou a tela-tecido ganham força e se tornam uma presença constante nas coleções de estilistas famosos como, por exemplo, Kenzol, que afirmou: “ o poder de evocação de uma pintura é minha primeira inspiração na hora de estampar um tecido. Afinal, a tela também é um tecido.” A principal fonte de inspiração de Kenzo são as flores presentes na obra de três célebres impressionistas: Vincent Van Gogh (1853-1890), Henri Matisse (1869-1954) e Claude Monet (1840-1926). E Kenzo, definitivamente, sabe, graças à sua cultura oriental, bem utilizar os motivos florais e seduzir, seu público consumidor, com o poder emocional, o poder lúdico das flores, que surgem em suas coleções ora brincalhonas e dinâmicas, ora nostálgicas e românticas, comovendo a alma.

Já o estilista francês Jean-Paul Gaultier tem, no final dos anos 90, a mesma opinião expressa por Gabrielle Coco Chanel nos anos 20/30 do século XX. Trocando em miúdos, ele, assim como a imortal estilista, é contra a moda-arte, se opondo à sacralização artística da moda. Para Gaultier a moda necessita ser algo prático, baseado no que se vê nas ruas. Mas nem ele resistiu aos apelos de artistas da vanguarda. Já estampou ambiências de cabaré, retratadas pelo pintor impressionista Henri de Toulouse-Lautrec (1864-1901), assim como já utilizou imagens da pintora mexicana Frida Kahlo e do guerrilheiro Ernesto Che Guevara em anúncios de óculos da etiqueta Jean Paul Gaultier na revista francesa Depéche Mode,

4.1 A linguagem dos tecidos

Quem melhor definiu que uma estampa artística fala, assim como um quadro, mais que mil palavras foi uma brasileira. Estamos nos referindo à estilista Zuzu Angel. Em 1971 ela realizou um desfile no consulado brasileiro em Nova York para denunciar o assassinato do seu querido filho, Stuart Angel pelo governo militar chefiado por Emilio Garrastazu Médice. Na passarela, Zuzu colocou vestidos estampados com anjos machucados, anjos feridos, anjos e tanques de guerra e manchas vermelhas. Essa foi a primeira moda-política que se tem notícia. Nela, o humor negro e o trágico se combinavam. Zuzu Angel tornou-se notícia nos principais jornais americanos. E a fecundidade da sua criação a levou a nunca copiar a moda estrangeira. Zuzu, inspirada no seu sobrenome de casada que vinha a ser Angel (anjo em inglês) criou uma estampa com pequenos anjos, estampas com pássaros e borboletas, motivos tropicais. Foi tão inovadora que acabou sendo copiada por Féraud, Valentino e Cacharel, célebres estilistas internacionais. Ou seja, Zuzu foi uma autêntica criadora de moda, inovando inclusive nas estampas e até fazendo uma moda-denuncia sendo precursora e acabou sendo a vanguarda da vanguarda, antecedendo comportamentos e modas.

No Brasil do final dos anos 90 quem realizou um trabalho criativo no jogo de coares em tecidos na mistura inusitada de padronagens e texturas é o cearense Villa Ventura,que foi capaz de realizar jogos de cores, semelhantes aos da arte abstrata, da arte moderna, onde a cor é vista como um sopro divino, que dá vida ao desenho, sem perder de vista suas raízes nacionais, mais precisamente nordestinas.

Na Europa e nos Estados Unidos os principais museus oferecem tecidos e lenços com estampas que reproduzem célebres quadros. Em Havana, capital de Cuba, há um movimento artístico chamado “o belo e o útil” que inclui a reprodução de quadros de conhecidos pintores s cubanos em tecidos que são vendidos, dentro do Museu Nacional, a metro. E há estampas com diversos estilos: abstratas, surrealistas, cubistas, primitivas, etc. Já o Museu Picasso , localizado em Paris, vende belíssimos lenços que trazem estampados os mais conhecidos quadros de Pablo Picasso (1881-1973), genial pintor, que inventou o cubismo, um estilo hoje consagrado das artes modernas.

Sem dúvida a roupa com uma estampa baseada em uma obra de arte traz um diferencial que atrai o consumidor. Que o diga o famoso estilista japonês Issey Miyake que fez três mil exemplares de um vestido que trazia a versão da artista plástica Yasumasa Morimura que vive em Osaka ( Japão ) do quadro ¨Le Source¨ do pintor Jean Auguste Dominique Ingrés. Um lembrete: a obra de Ingrés faz parte do capítulo dois, onde analisamos e definimos cada estilo artístico.

Vale destacar que Issey Miytake realizou uma exposição de moda-arte na Fundação Cartier em Paris ( França ).onde o tema da exposição eram as peças de roupas. A maioria feita em jérsei de poliéster, com estampas de quadros. E no tocante à estampa houve uma presença constante: o quadro ¨Le Source¨de Ingrés, mães uma vez visto e revisto pela artista japonesa Yasumasa Morimura, parceira constante de Miyake. Ao ser indagado se aquelas vestes, aquelas roupas eram arte, Issey preferiu defini-las como arte útil, a caminho do século XXI.

No Brasil, vale salientar o trabalho realizado pelo paisagista Burle Marx,que amava estampar tecidos e criava estampas que eram verdadeiras obras de artes. Ele afirmou, numa entrevista ao jornal O Globo que se identificava com a moda pelo seu caminho de renovação.

A artista plástica Mucki Skowronski também cria estampas em tecido. Em seu atelier, ela cria tecido utilizados sobretudo em decoração. ¨ Algumas estampas são inspiradas, sim em Matisse, Miró e Picasso. Mas só inspiradas, pois não copio ¨, afirma Mucki que considera absolutamente normal um tecido trazer uma estampa artística. ¨ Afinal, nós precisamos, muitas vezes, valorizar um tecido, utilizando, na estampa, na padronagem, um motivo artístico inovador ¨. No seu atelier de costura, Mucki fabrica colchas, cortinas, almofadas e muitas outras peças para a decoração de casas e escritórios, que vendem bem. Já as roupas com estampas exclusivas, estas saem pouco. Ana Paula Guinle, em seu atelier na Lapa e também no site (WWW.atelierdeindumentária.com.br) pinta tecidos com arte para inúmeras etiquetas do Rio de Janeiro, de São Paulo e de vários outros Estados brasileiros. E, para finalizar, vale lembrar o trabalho pioneiro de Hélio Oiticica (1937-1980), artista neoconcreto, responsável pela criação dos parangolés – esculturas móveis feitas em bandeiras, estandartes ou tendas, feitas para serem vestidas e movimentadas. Com os parangolés, Helio Oiticica repensou a questão da escultura, que passou a ser maleável, feita em tecidos e incorporada ao corpo humano.