domingo, 23 de março de 2014

O PODER E A MODA - Texto de Ruth Joffily

      "(...) E para deixar claro o tipo de relação que os partidos políticos brasileiros - sejam de esquerda, de direita, de centro-esquerda ou de centro-direita - mantêm com o assunto moda basta ver que todos têm em comum o aparente desprezo pela moda como forma de  comunicação. No caso das mulheres que ocupam cargos políticos ou que vivem na "corte brasiliense" o estilo predominante é o "dama de ferro", leia-se o impessoal blazer e saia reta, consagrados por Margareth Tatcher, ex-Primeira Ministra da Inglaterra. Esse foi o estilo adotado, por exemplo, pela primeira mulher a assumir o Ministério da Administração, Claudia Costin, ex-militante do PCdo B, que foi nomeada ministra no final do primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso. Depois da reeleição de FHC ela ocupou ainda uma Secretaria do Governo. Numa reportagem ao  "Caderno Mulher" do Jornal do Brasil (01/08/98), Claudia afirmava 'não se preocupar em comprar roupas. O estilo é claro, clássico, com tailleur básico, normalmente em cores escura (...)".
     Quem também assumiu os tailleurs depois que chegou ao poder foi Ruth Cardoso, Numa matéria da Veja, de 11/2/98, cujo título é a "virada da Ruth", é dito que o "seu guarda-roupa mudou: antropóloga, que usava calça de elástico na cintura e colares artesanais de madeira, hoje tem um armário de tailleurs . (...) E ela afirma: "eu não tinha essas roupas, não precisava delas ...". Ao falar das suas antecessoras no cargo de primeira-dama, a reportagem diz que elas "apresentavam dois comportamentos padronizados. Ou gostavam imensamente do novo papel, como no caso de Dulce Figueiredo e Rosane Collor, ou preferiam a discrição absoluta, como Marly Sarney ou Lucy Geisel." Na reportagem , Dona Ruth declara "fugir da peruagem como o diabo da cruz."
     No livro "Iara" de Judith Lieblich Patarra (editora Rosa dos Tempos), que vem a ser uma "reportagem biográfica", a autora assinala que a estudante militante Iara Iavelberg admirava o viver intenso e a alegria.
        "(...) E numa reunião da POLOP  onde foi analisada a cassação dos direitos políticos do então governador Adhemar de Barros, houve uma das costumeiras discussões sobre finanças. O compromisso de contribuírem com uma percentagem do salário falhava. Naquele dia, sem calcular o impacto, Iara descreveu as novas roupas.
     __ "Torrei meu pagamento.
     ___ Como você compra o supérfluo se precisamos tanto de dinheiro? --- Atacaram ao acrescentar  às reprimendas  --- Roupa é acessório de burguês."
     Segundo Judith Lieblich Patarra, a autora da biografia, Iara, aborrecida, ironizou os discursos e defendeu-se, advertindo que "num trabalho ilegal, dar na vista seria cana certa. Burrice as militantes andarem molambentas, os companheiros que ouvissem a voz do povo - "o hábito faz o monge". Só para concluir, essa moça tão inteligente e de raciocínio tão claro em relação à importância do vestuário, a ponto de questionar seus companheiros de organização política, foi assassinada pelo regime militar.

(trecho localizado na página 66 do livro "O Brasil tem estilo?, de Ruth Joffily - Editora Senac - ano 2000 - o livro, no momento, está esgotado. Há alguns exemplares à venda no site Estante Virtual.
   
 Uma observação: é uma pena que muitos políticos ainda não enxerguem a importância da industria da moda para a economia nacional, para a economia global, inclusive porque emprega muita mão-de-obra feminina, mulheres que, em sua maioria, são chefes de família.

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