segunda-feira, 31 de março de 2014

O CORPO FEMININO FRAGMENTADO , NA MIDIA

     " As bundas são lindas, assim como as bocas eram lindas, no tempo do cinema mudo", afirmou a estilista Marilia Valls, quando lhe perguntei o que achava do "circo" da hiper visibilidade das nádegas femininas na mídia, nos atuais tempos modernos, neo liberais, desta primeira década do século XXI.
     Diz o filósofo Gilles Deleuze: "quando a boca morreu, consultaram as outras partes do corpo para se saber qual delas é que havia de se encarregar do enterro (...)"
     Quanto mais as midias neo-liberais dizem que são livres, e chegam a defender um não compromisso ideológico, mas se percebe que há um compromisso sim, de esvaziar todo e qualquer pensamento que tenha uma ideologia, desmistificar tudo e todos, sobretudo, no caso das imagens femininas, a sensualidade. O que se vê é uma sensualidade "normatizada/formatizada", uma mega exposição de orgãos sexuais, a sexualidade mecânica, óbvia, feito nos filmes pornográficos.
     Os recortes do corpo, ali uma bunda, ali seios siliconados, ali umas coxas que receberam "injeções" de  silicone ou de anabolizante. O ato de fragmentar o corpo, permitiu, hoje, que a bunda se torne a cara. Há inclusive uma música chamada "Pagu" (uma homenagem a Patricia Galvão, participante da Semana de Arte Moderna de 1922) de Rita Lee e Zélia Duncan, gravada por Maria Rita, filha de Elis Regina, onde a letra afirma: "Nem toda brasileira é bunda, meu peito não é de silicone. Sou mais macho que muito homem (...)"
     De máscara, botas e chapéu de vaqueira, Michele P é a  "Bandida" e afirma , em entrevista à revista Isto é: "exponho meu corpo, minha bunda, meus peitos numa boa. Mas escondo a minha cara. E faço o "funk" da 'Bandida' - vou roubar os corações dos peões, vou seduzir, quero todos para mim. Mexo tanto com o libido masculino que precisei sair escoltada na última festa dos peões em Barretos, interior de São Paulo. A "Bandida" vem a ser um clone da ex-Feiticeira e da ex-Tiazinha. No caminho oposto dos palhaços, com suas roupas largas, sapatos grandes, nariz vermelho e um eterno sorriso, mestres na arte de provocar sorrisos, a "Bandida" e outras mulheres que circulam pelas grandes pequenas cidades do Brasil, com suas bundas bem destacadas, almejam provocar o libido, e para isto vale tudo.
     Numa entrevista, a crítica Barbara Heliodora afirma que o teatro, no momento, chama/atrai  o público pela nudez, pelos gestos obscenos e pelo uso ostensivo de palavrões. "Há muitas comédias apelativas, de baixaria. Tudo é chanchada. A coisa que mais incomoda hoje em dia no teatro, o que me dá vergonha, é ver o público cair na gargalhada cada vez que uma atriz solta um palavrão. Me dá vergonha, como brasileira,  as pessoas acharem aquela baixaria uma maravilha" E conclui a Bárbara Heliodora: "Não estou querendo censurar, nem quero um teatro moralista. Mas não se pode deseducar a este ponto. Onde estão os sonhos, onde está a ideologia? Shakespeare escrevia teatro popular. E teatro popular não precisa ser ruim, vazio."
     No mix original de atração consumista: a bunda e os peitos, manipulação de símbolos. Aceitamos nossa "inferioridade" neste paternalismo "soft"?  A nossa garantia de paz social é realizada através do trabalho (custo baixo) e baixa escolaridade.
     No jornal O Globo volta-se mais uma vez a se dizer que a prostituição de adolescentes "não tem mais hora , nem lugar. No sábado, por volta das 13 horas, uma mulher de uns 40 anos abordava homens desacompanhados na fila de uma rede de "fast-food", em Copacabana,  zona sul do Rio de Janeiro. Oferecia meia hora de sexo, com uma menina que aparentava 14 anos por R$ 20,00 (vinte reais)".

(um texto realizado quando fazia mestrado de comunicação e cultura na UFRJ - 2002 - professora-orientadora: Raquel Paiva.

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