sábado, 3 de maio de 2014

ANOS 60, MOVIMENTO HIPPIE, LEILA DINIZ







     
       O movimento hippie chegou ao Brasil quando John Lennon já havia decretado "o sonho acabou". Entre nós, essa era uma realidade mais do que contestável. Vivíamos em um regime militar. Por isto havia uma diferença radical entre o hippie norte americano e o hippie brasileiro. 
       Lá, a pessoa se excluía da sociedade para criar uma sociedade alternativa. Aqui criava-se formas de sobrevivência alternativa para se afastar do pesadelo em que se constituía a sociedade.

      Pouco se pode falar sobre o posicionamento social do movimento hippie no Brasil. Era uma reação. Era uma forma de escapar, mas sem propostas efetivas de construir. As comunidades hippies que existiam, como na Praça General Osório e no Pier, em Ipanema, eram todos núcleos comunitários, razoavelmente fechados, quase como agrupamentos de proteção mútua. Não havia aquele sentimento de conquistar o mundo. Havia sim o sentido de prazer imediato, de aproveitar intensamente o momento, antes que o mundo acabasse.
      Uma das grandes revoluções do vestuário dos anos 60 foi a dupla jeans e camiseta. Roupa de guerra dos estudantes, uniforme de passeata, de contestação. Ambos tinham origens humildes. Eram peças do vestuário dos trabalhadores. O jeans, uma calça resistente e durável, perfeita para pegar no batente. A camiseta, até então, simples roupa debaixo, para proteger contra mudanças bruscas de temperatura, para impedir o suor de estragar a camisa. Mas no despojamento geral dos anos 60, viraram vestimenta de honra, símbolo, marca da época. Claro que no correr dos movimentos sociais, foram ambos adotados pela industria da moda, perdendo seu ar revolucionário, transformados pelas grifes em consumo. Mas o que nunca perderam foi aquele toque de liberdade, de deixar o corpo mais à vontade para curtir os movimentos da vida, tônica dos anos 60 que não aconteceram à toa e que deixaram justamente este direito ao prazer como herança para o futuro.
     Ao aparecer de biquíni, com sua exuberante barriga de grávida, Leila Diniz mostrou que fertilidade não é necessariamente acompanhada por assexualidade. Que ser mãe não é deixar de ser mulher. Era a explicitação assumida e feliz do pecado original. Já estávamos nos anos 60. Já era hora de gravidez deixar de ser vista como uma doença. O cineasta Domingos de Oliveira chamava Leila Diniz de "a mulher solar". Em anos de repressão, irradiar luz era crime. Leila foi perseguida, impedida de trabalhar, ameaçada. Contra ela se voltaram as bocas do conservadorismo, consagrando-a como a perdição moral e dos bons costumes que, afinal, o golpe de 1964 viera resgatar. 
     Leila Diniz foi a explicitação da vida. Entrou na história como um marco da revolução de costumes pela maneira saudável como assumiu a gravidez de Janaína, por tudo que irradiava. 
     Nos registros oficiais, para alivio do conservadorismo, morreu muito jovem, em junho de 1972, num desastre aéreo, fora do Brasil. Mas para nós, mulheres, o caminho que Leila abriu, ficou. Ficou para sempre. A prova são as praias com grávidas de biquíni, as ruas onde as grávidas "desfilam" seus barrigões, deixados à mostra através da utilização de miniblusas, de calças-leggings bem ajustadas ao corpo, etc. As comportadas batas, que "escondiam" as barrigas, estas foram deixadas de lado. Valeu, Leila Diniz!!
     (texto que escrevi para o jornal  AMALeme  - zona sul do Rio de Janeiro)

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