segunda-feira, 5 de maio de 2014

O BONÉ FRÍGIO POR CARLOS HEITOR CONY






O BONÉ FRÍGIO -  "Rio de janeiro - O assunto está meio velho, foi da semana passada, mas parece de antes de Cristo,contemporâneo das  Guerras Púnicas e da invenção da roda. Lula recebeu integrantes do Movimento Sem Terra e colocou na cabeça um gorro ou casquete do MST.

     Tiraram conclusões terríveis do gesto. Seria uma opção, ele, presidente da República, despia de seus atavios constitucionais e colocava na cabeça o capacete da contestação,o boné frígio da Revolução.
     Não tenho poupado  o presidente de críticas, talvez injustas e apressadas, talvez nem tanto. Mas condená-lo pelo uso do boné ´e dose. Quando esteve no Brasil pela primeira vez, o papa colocou em sua pontifical cabeça coisas estranhas, direi mais, coisas estranhíssimas. Cocares de índios de diversas tribos, chapéus de vaqueiro, capacetes de operários. Só recusou mesmo um turbante que parecia coisa de Carmem Miranda. Não combinava com sua batina branca.
     Em campanha eleitoral do passado, Lula visitou a "Manchete", almoçou com a diretoria e com os redatores da casa. Na hora da sobremesa, colocou uma estrela do PT na lapela do dono da revista, que podia ser tudo na vida, menos um petista. Mas tinha senso de humor e não dava bola para as miudezas da vida. Foi fotografado com a estrela do PT e a usou nos dias seguintes, comparecendo a cerimônias onde causava escândalo, um símbolo do capitalismo com o distintivo do partido dos operários.
     Assis Chateaubriand, que em muitas coisas se parecia com o Adolpho Bloch, enfiou na cabeça de Churchill um chapéu de cangaceiro. É evidente que não tornou o ex-primeiro ministro inglês um jagunço do sertão.
     Lula é presidente de todos os brasileiros, inclusive do pessoal que integra o MST. E também da turma contrária, a bancada dos ruralistas, gente que, para conforto presidencial, não usa boné. Usa outras coisas."
(Crônica de Carlos Heitor Cony, publicada no jornal "Folha de São Paulo, em 09/07/2003. Fiz uma transparência e apresentei esta crônica em uma aula, para refletirmos, alunos e eu sobre o valor de um boné. No Brasil (e no mundo) camisetas e bonés se transformaram em outdoors.
Bonés de marcas consagradas, viraram  sinônimo de status. Usar um boné do MST transforma, num passe de mágica, quem o usa em um revolucionário/contestador ou em um "vagabundo"?  E quem usa boné da marca Nike, o que é? Julga-se a pessoa pelo que ela veste e põe, literalmente, na cabeça. Você concorda? Dê, por favor, sua opinião).

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