sexta-feira, 23 de maio de 2014

LUXO,RECESSÃO, MÚSICA E REPRESSÃO - ANOS 30-40



     UMA DÉCADA DE CONTRASTES NO CINEMA, O LUXO DAS ESTRELAS É A RESPOSTA AO CLIMA DE AUSTERIDADE E COMEDIMENTO GERADOS PELA RECESSÃO ECONÔMICA. EMERGEM, NA CENA POLÍTICA, AS DITADURAS E IDEOLOGIAS TOTALITÁRIAS. ANOS DE CENSURA NAS ARTES, NOS COSTUMES, SÃO COMPENSADOS PELO SONHO E PELA FESTA INGÊNUA DOS MUSICAIS. OS SAPATOS E A MODA REFLETEM AS APARENTES CONTRADIÇÕES DESSE TEMPO QUE ANTECEDE Á II GRANDE GUERRA. E AINDA, REAFIRMAM-SE EM ESTILO E EXTRAVAGÂNCIA POIS, MAIS DO QUE NUNCA, O SHOW TEM QUE CONTINUAR.




     No início da década de 1930, a festa acabou. As saias descem seis dedos abaixo dos joelhos e as pernas deixam de ser o foco das atenções; as mulheres frisam seus cabelos, agora mais compridos. A volta da cintura à sua posição original sinaliza um momento histórico: em termos econômicos, a depressão da América (do norte), em termos políticos, a ascensão de Hitler ao poder na Alemanha e de outros líderes totalitários como Franco, Mussolini e Salazar pela Europa. No Brasil, o ditador é Getúlio Vargas.
   
                        TESOURA E BOM
                        COMPORTAMENTO

     O laissez-faire (deixe fazer) da economia de mercado e da vida, nos anos de 1920, foi substituído pelo laissez-rêver (deixe sonhar) embalado pelos musicais de Hollywwod e da Broadway. Eram a válvula de escape ou superação de toda uma população, sob os efeitos da recessão econômica e do autoritarismo político. 
     Nas telas, Fred Astaire e Ginger Rogers nunca se beijavam. Seus ardores estavam na dança, nos pés ritmados. A atriz Jeanette Mac Donald fez dupla com os atores Maurice Chevalier e Nelson Eddy, em histórias cheias de fantasias pouco arrojadas. Os tempos exigiam bom comportamento. 
     Assim pensavam os atentos censores da indústria cinematográfica dos Estados Unidos. O que consideravam excesso ou ousadia era cortado. Vítima dessa"tesoura" foi o filme Merry Window , realizado em 1934. O público não pode ver a cena em que Maurice Chevalier calçava um clássico escarpin de couro no pé, envolto numa meia de seda, da atriz Jeanette Mac Donald. Os censores foram implacáveis. Exigiram que a atriz mantivesse os dois pés no chão ...
     Claro que , esse jeito mais contido de encarar a vida, também influenciou a moda.

                            TUDO NA SUA HORA
                            TUDO NO SEU DEVIDO LUGAR

     Surgem os estilos para o dia, para o chá, para o passeio, para o jantar. É o luxo racionalizado, que vai gerar, posteriormente, os trajes esporte, passeio, passeio completo e gala. Nos acessórios, nasce a idéia dos conjuntos. Ou seja, ter -- para cada estilo de roupa ou para cada ocasião social -- uma bolsa e um sapato que combinassem entre si ou fossem da mesma cor. Quanto mais compromissos sociais uma mulher necessitava cumprir, mais conjuntos de sapatos e bolsas precisava ter. Os modelos passam a ser mais detalhados e reinam os bicolores. Surgem o salto plataforma, as tiras e coleiras no tornozelo. Os conservadores protestam quando os dedos e calcanhares ficam à mostra. Provavelmente, preferiam os vestidos noturnos que cobriam os pés, mas abusavam de sensuais e generosos decotes.

                          MASCULINO/FEMININO

     Nos últimos anos da década de 1930, os vestidos com rendas, frous-frous ou detalhes delicados cedem lugar ao tailleur, que se transforma na grande moda. Percebe-se que o estilo feminino se aproxima das tendências masculinas. 
     Os sapatos mais pesados, com salto grosso, abotinados ou de amarrar, são cada vez mais usados, inclusive com calça compridas, lançadas em 1933/34, sem grande repercussão ou aceitação no Brasil da época.

                    ORNAMENTA-SE COM
                       "NADAS"

     Em 1939, Adolf Hitler invade a Polônia e tem início a Segunda Guerra. Neste mesmo ano, nada varia mais do que a silhueta feminina. Impressionada, uma repórter da revista norte-americana Vogue chegou a escrever o seguinte comentário: "Você pode ter a aparência tão diferente de sua vizinha, quanto o sol e a lua, e ambas estarem certas."
     A coquetterie liberta-se de todo e qualquer luxo. Tira-se o máximo de efeito com o mínimo de despênio. Ornamenta-se com "nadas". Na falta de meias de seda com costura atrás, as mulheres pintam um risco no meio da perna e calçam seus sapatos. E, equilibrando-se nos saltos,sonham com dias melhores.

(texto que escrevi para o livro "Sapatos:crônica de uma sedução - 1900-2008 - edição comemorativa dos 40 anos da Francal - SP. Projeto e coordenação editorial de Perla Nahum. Autores: Fernando de Barros (In Memoriam), Constanza Pascolato, Cynthia Garcia, Débora Chaves, Eda Romio, Gisela Porto, Iza Smith, José Simão, Lilian Pacce, Maiá Mendonça, Mônica Figueiredo, Nirlando Beirão, Regina Guerreiro, Ruth Joffily)



































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