quinta-feira, 22 de maio de 2014

TEMPOS MODERNOS. O MUNDO DE PERNAS PARA O AR - 1920-1930

Geovanna Morcelli/UOL

 MULHERES ATIVAS, IGUALDADE ENTRE SEXOS, AMOR LIVRE E ... MUITO JAZZ. O CULTO Á SIMPLICIDADE, AOS ESPORTES, AO RITMO E, SOBRETUDO, A UMA NOVA LIBERDADE.

     A nova silhueta da mulher européia, livre do espartilho, com as pernas e pés à mostra, foi a grande marca dos anos 1920. Os homens haviam permanecido nos últimos anos da I Grande Guerra do século XX (1914-1918), longe de casa, nos campos de batalha.
     É quando as mulheres passam a ocupar posições no mercado de trabalho e a precisar de roupas e sapatos adequados para se colocarem em atividade, em contraste com o ócio opulento que o estilo da Belle Époque consagrava. Igualdade entre sexos, amor livre, novo status para casadas e solteiras dentro da sociedade ... Todos estes temas centralizavam conversas.
   

                        NOVA MULHER, NOVA
                        SILHUETA, NOVOS
                        COSTUMES, NOVOS SAPATOS

     Os vestidos longos e pesados, a função meramente decorativa das roupas e acessórios, nada disso se adaptava mais a uma mulher ativa, independente, que trabalhava e tinha condições financeiras para se sustentar. E que acabava de descobrir o fascinante poder do dinheiro. Uma mentalidade utilitarista comandou o estilo da época. As peças precisavam ser funcionais, havia um culto à simplificação, ao depuramento ou, como afirma o historiador inglês James Laver, "o novo ideal erótico era andrógino".
     A moda dos anos 1920 não demonstrou interesse em valorizar as curvas na silhueta feminina. Vestidos tinham decotes rentes ao pescoço, cintura baixa, um caimento sem definição nos quadris e busto. Os cabelos eram curtos, rentes e logo foram batizados de 'à la garçonne'. Outra demonstração de funcionalidade estava no estilo dos sapatos. Linhas geométricas, caracterizadas por tiras, que se prendiam no peito do pé, recortes, cortes e aberturas, comungavam com saltos rasos, médios ou altos mas nunca finos. O pisar com segurança e estabilidade fazia parte das conquistas da mulher pós Primeira Guerra.
    
                              DANÇAR A VIDA ...

     A paixão pela dança não tinha limites. Dançava-se muito ao som das Jazz Bands, que invadiram as casas noturnas e as grandes festas em mansões, no estilo do filme "The Great Gatsby", baseado no romance de Francis Scott Fitzgerald. Nas danças, imprimia-se o ritmo frenético da época. E a cada passo, parecia que as pernas e pés ganhavam autonomia e declaravam: "ao invés de lamentar a vida, nos entreguemos à sabedoria de dançá-la."

                             PERNAS FORA DA LEI

     As saias, em 1925, chegaram a descobrir os joelhos. Foi o primeiro momento da história moderna em que as pernas estiveram em destaque. Que revolução ... Os conservadores reagiram. Em Utah, nos Estados Unidos, um projeto de lei previa multa e prisão para quem usasse nas ruas "saias de comprimento acima dos tornozelos". Outro projeto de lei, este em Ohio (também nos EUA) tentava proibir "qualquer mulher, acima dos quatorze anos de idade, de usar uma saia que não chegue à parte do pé conhecida como arco". Foi tudo em vão. Como os pés são a base de um corpo erecto e independente, as mulheres dos anos 1920 ansiavam pelo direito de expô-los publicamente, transformando-os, junto com as pernas, num foco de sedução. Voavam nos salões, ao sabor das danças e dirigiam seus carros, para andar rapidamente pelas ruas.
     No Brasil, Pagu (apelido de Patrícia Galvão) e Tarsila do Amaral, duas participantes da Semana de Arte Moderna, abraçaram os novos tempos da mulher em momentos raros de ousadia. O cartunista J. Carlos criou a Melindrosa, que passou a simbolizar a nova mulher brasileira, mais livre, mais solta.

                             DESFECHO SOMBRIO

     O crack da bolsa de valores, em Wall Street, Nova York, que ficou conhecido como a "Quinta-Feira Negra de 24 de outubro de 1929" provocou inquietação, medo, pânico. Foi um balde de água gelada na euforia dos "anos loucos". O legado estético e cultural dos anos 1920, contudo, permanece até hoje sendo, juntamente com o da década de 1960, o mais significativo e característico do século XX.

(texto que escrevi para o livro "Sapatos- Crônica de uma sedução - 1900-2008 - edição comemorativa 40 anos - Francal - SP - Projeto e coordenação editorial - Perla Nahum - autores Fernando de Barros (In Memoriam); Constanza Pascolato, Cynthia Garcia, Débora Chaves, Eda Romio, Gisela Porto, Iza Smith, José Simão, Lilian Pacce, Maiá Mendonça, Monica Figueiredo, Nirlando Beirão, Regina Guerreiro , Ruth Joffily.



Acima, a "Melindrosa", personagem criado por J. Carlos






        

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